segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Quando li Schopenhauer...

Quando Schopenhauer  fala do amor, da morte, da arte, da moral, da religião, da política e da relação homem e sociedade, ele nos mostra suas inquietações, fazendo referência o contexto histórico em que viveu. Mas, também daquilo que não preenche a alma humana, tais como o egoísmo, o falso moralismo e o lado abjeto do animal humano.

Arthur Schopenhauer (1788-1860)

    Em Dores do Mundo, Artur Schopenhauer, mediante sua filosofia, aponta diante as dores e as misérias humanas, “que na Terra um  sofre a pena da sua existência, e cada um a seu modo.”  Essa premissa  nos possibilita pensar, que temos que buscar uma inspiração nobre ou algo “mágico” para (sobre) viver. É imprescindível, buscarmos uma maneira de proceder, “de se fazer ouvir” para  não sentirmos a dor da vida prática.

    Assim, compreendo o quanto a felicidade é algo difícil de encontrar quando nos encharcamos com “os erros funestos  da vida inteira”. Afinal, nosso mundo é senão o inferno de Dante. Em lugar das alegrias do Paraíso, temos a nossa volta as dores e as misérias desenhadas na página infinita do espaço e do tempo.

    Portanto, me pego a perguntar: Porque o desejo e o sofrimento caminham lado a lado, desenvolvendo-se sem limites?

    O social é que nos orienta e regula a nossa conduta, estabelecendo normas e valores para as coisas. É verdade que vivemos uma época trágica, onde é visível a angústia infinita das almas livres. Mas, toda essa gente resiste a todas as chuvas e ao vento da vida diária...

Algo me faz pensar, que estamos submersos na terrível velhice (deste último século), que os anos imprimem. Talvez, a humanidade esteja a espera de Prometeu, que desejou salvarmos da miséria dos homens.

A revelação dos dias nos mostra que na luminosidade das manhãs ou na opulência natural das noites, os homens terminam anulados pelo cotidiano. Onde, gotas de luzes e cores oferecem à alma um gozo desmensurado.

Por entre  ruas escuras caí o amor dos homens em fontes profundas. Eis, ali, o afã que cavalga o presente futuro. Corações endurecidos, sórdidos e velhos invadem os jardins, onde o vento das alturas desprendem açoites que condicionam em nós o abrasamento das fogueiras vivas.

Que brota da alma, um corpo febril, símbolo e expressão de si mesmo. Que desterra de cânticos sagrados, o bem e o mal. E, arrebanha da obscuridade da sombra noturna a natureza humana.

Criaturas que se entregam a loucura dos sacerdotes. Falsos sábios, que divulgam uma pseudo-sabedoria, que glorifica o eu e santifica a alienação. Assim, vejo os homens submissos aos pés divinos, receberem na face o cuspe do bendito egoísmo.

A manhã que está oculta, à tarde que se descobre. Assim, nos arrastamos sobre duros ombros e somos tolhidos pela, mormente cotidianidade. Uns ajoelham-se e deixam-se carregar pelas falsas promessas. Outros resistem às palavras e aos valores estranhos.

O interior da luz é vicioso, cheio de nobres adornos, de bela aparência. Alma minha que se lança no olhar dos teus olhos. Que chora as lágrimas e os prantos alheios.

Com um facho de claridade caminho pelo passado, onde jogo dados com os deuses, na mesa divina da terra. É, esse o meu universo! No domínio dessa órbita persigo o tempo, onde não deixo escapar uma verdade fugidia. Porém, degusto e como do puro alimento da vossa ciência. Mas, dificilmente, "estendem-se em mim, tua negra ignorância".

Não quero ser hóspede de teu corpo, o que me atrai é a tua doutrina, que explica à própria a gênese da vida. A dor tem que morrer, pois a vida é um espetáculo, embora nos conduza às angústias cotidianas.

Atrás das formas e cores variadas, sou visto como um pensamento inefável, oculto e espantoso. Um cego que pede e dar esmola, mas que não enche sua sacola. Contemplo a escuridão e me curvo diante de um deus desconhecido, incógnito.

Setes olhos trespassam e perseguem. Arranca(m) torturas, lhe impõe suplícios. Funesto e encantador é teu riso colérico, que anuncia em pensamentos falsas verdades. Desse modo escuto uma voz que diz:

-- Quem és tu?
Exclamou o velho sábio, dizendo tristemente:
-- Eu sou um deus verdugo, cansado dos tormentos humanos.

Desviando o olhar para o céu, procuro a grandeza do brilho da luz. Os olhos marejam, procurando por entre os bosques lunares à singular humanidade. Ao longe, vejo, os homens como "insetos cegos voando sem direção".

Agora, o subúrbio é um mundo estranho, que já não existe para o centro -- urbano e capitalizado -- de sonhos e prazeres. Do lado de cá, toda àquela gente louva com cantos, odes e poemas um deus diminuto.

À pobreza do alto e baixo sertão está regada pela fome, miséria e analfabetismo.       Que oportunidade terão àqueles de seguirem seus destinos? Triste verdade não proporciona o disfarce de tal situação. As esmolas que recebem são acondicionadas em pacotes distintos. De distantes paragens, desvalidas criaturas esbarram na contramão da vida retirada.

Por aí, além, morrem-se da seca, da morte matada, dos esforços fracassados, das dificuldades invencíveis... Dotara a natureza a sombra de um velho juazeiro, que naturalmente remove o óbice da secura dos ares.

Com lágrimas nos olhos o sertanejo aprecia espantado o velho torrão. Fugindo dos raios do sol, caminha lentamente por sobre a aridez da terra inóspita. Seus olhos brilham diante da profunda solidão. A pele luzidia contrasta com o suor que escorre pelo rosto evidenciando as marcas que a vida imprime. Mesmo turvas, clama aos céus pelas águas da chuva.

Por entre o crepúsculo, rompe a luz, um vulto humano que salta em órbitas, cujos olhos adornados pelos espaços vazios em estilhaços, em meio a patéticos anos, condicionam em negras cores a dureza e o peso da vida diária.

Figura humana que responde em silêncio. Como a morte, colhe o ímpeto que nos obriga a mergulhar na extrema solidão dessa dor profunda, desfigurando a luz da manhã e a fisionomia de todo homem, descrevendo em diferentes fases o desespero de criaturas inanimadas, cujas mãos piedosas arrastam-se em busca de Deus.

Depois de longo e profundo silêncio, o velho Chicó sucumbiu... Voz altaneira das terras longínquas, morrera suspenso na cruz por não suportar seu inferno. De expressão dolorosa e sombria, aquele pobre homem de aparente palidez anunciava uma excessiva piedade, estava cansado do mundo dos homens.


P.S.: O velho Chicó é a expressão da dignidade das personagens trágicas que encontramos na vida diária.

    O livro Dores do Mundo nos traz diversos aspectos do pensamento de sua época e procura estabelecer uma ligação com o sofrimento humano do passado e o estado em que se encontra o pensamento filosófico, científico, religioso do século XIX e tenta vislumbrar as perspectivas para um “melhor dos mundos possíveis”. Por essa razão, creio que haja um futuro seguro para a humanidade, a partir do momento em que sejam purificadas as inverdades, que não haja espaço para as superstições e os preconceitos, que as religiões impostas e desumanas, porquanto unicamente divinas e tirânicas, não sejam capazes de impedir a liberdade, sobretudo do espírito, do passado histórico cristalizado, enfim, depurado de tudo o que é fantasia, crendice, pura imaginação.  Para sim, como bem observou Nietzsche sermos humano, demasiado humano.

Por José  Lima Dias Júnior

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