segunda-feira, 25 de abril de 2011

A palavra "História"

A raiz da palavra “História”, na língua grega, é weid-, ou wid-, raiz que, sintomaticamente, também se encontra no verbo latino “videre” (ver). O imbricamento de “ver”, “investigar” e “narrar” é surpreendentemente significativo na formação desta nova palavra. Hannah Arendt (2009, p.69) chama atenção para o fato de que istor significava originalmente ‘testemunha ocular’, “e posteriormente aquele que examina testemunhas e obtém a verdade através da indagação”. Por fim, o gesto de expor o resultado da investigação através do relato termina por compor a tríade de sentidos, de modo que, na História escrita por Heródoto em torno de 450 a.C, podemos surpreender pelo menos dois destes dois sentidos da palavra – “pesquisa” e “relato” – com especial clareza. De fato, no Prefácio desta obra, “história” se refere a uma “pesquisa” conduzida sistematicamente e com o uso da razão; ao mesmo tempo, em diversas passagens do livro, aparece o sentido de “relatório”, “relato”, “narrativa”; em uma palavra: de “exposição dos resultados de uma pesquisa realizada”. Ver por exemplo o livro VII da Historia, de Heródto, item 96 (1988, p.365).

É oportuno lembrar que, na época dos antigos gregos – muito antes de se relacionar a uma investigação específica sobre o passado vivido, ou de trazer para a centralidade de suas operações a noção de temporalidade – a História esteve simultaneamente associada às noções de (1) "investigação", (2) "relato" e (3) "testemunho ocular". Essa tríade de sentidos, intimamente imbricados no termo grego istorie, antecipa surpreendentemente a complexidade futura da palavra História, uma vez que desde então a nova prática parecia querer se referir simultaneamente a um tipo de pesquisa, a um modo de escrita, e às fontes deste tipo de conhecimento. A ‘pesquisa’, para Heródoto, deveria se dar em forma de um "inquérito" com "intenção de verdade"; a ‘escrita’ assumiria o gênero narrativo, e as ‘fontes’, para os historiadores gregos, ainda deveriam ser preferencialmente oriundas de testemunhas oculares dos próprios acontecimentos.

Apenas mais tarde as idéias de "tempo" e de "temporalidade" vão sendo trazidas para a centralidade do fazer historiográfico, incorporando-se à sua identidade mínima. Aos poucos, o Tempo irá se incorporar como uma instância fundamental do fazer histórico quase como uma consequência do campo de interesses deste novo pensador/pesquisador que passaria a se apresentar como historiador. O mundo das ações humanas realizadas, esse universo sublunar de investigação que se diferencia radicalmente das preocupações supralunares da Filosofia, passa a se afirmar como o campo de interesses essencial para os historiadores. É a perspectiva de que somente o finito humano pode ser conhecido que se reforça em Heródoto a partir da sua eleição, para objeto de investigação, do ‘Passado’, ou melhor, da experiência já realizada, isto é, do "campo da experiência humana" – para retomar aqui um conceito proposto por Koselleck (1979). A única fatia da experiência humana que poderia ser efetivamente conhecida seria na verdade o Passado, que rigorosamente é a "duração realizada". É aqui, o "Tempo", este elemento que hoje quase que imediatamente associamos à idéia de História, começa a se insinuar discretamente como um elemento imprescindível para se estabelecer a identidade deste novo campo de expressão que seria a História
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Este trecho foi extraído do primeiro capítulo do 'Volume II' de Teoria da História. (item: "A História antes da História"). O item discorre sobre a historiografia que precede a instatalçaão de uma historiografia científica na passagem do século XVIII para o século XIX, e remonta às origens gregas da História,ou mesmo as relativas a outras civilizações. No item seguinte, adentra-se o período em que os historiadores passam a postular para o seu campo de saber um estatuto científico. O 'volume II' tem por objetivo central discutir os dois primeiros paradigmas que surgem com a Historiografia Científica: o Positivismo e o Historicismo, contrastando estes dois paradigmas historiográficos a partir das respostas que cada um deles dá à questão da relação entre Objetvidade e Subjetividade no fazer histórico. O volume encerra-se com uma discussão sobre o Relativismo.

Referências:
ARENDT, Hannah. "O Conceito de História – antigo e moderno" in: Entre o Passado e o Futuro. São Paulo: Perspectiva, 2009. p.69-126 [original: 1957].
BARROS, José D'Assunção. Teoria da História, volume II: os primeiros paradigmas - Positivismo e Historicismo. Petrópolis: Editora Vozes, 2011.
HARTOG, François. Le XIX siècle et l’histoire: le cas des Fustel de Coulanges. Paris: PUF, 1988.
HERODOTO. História. Brasília: editora Universidade de Brasília, 1988.
KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado – contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006 [original: 1979]. 
 
Fonte: Rede Histórica

domingo, 24 de abril de 2011

África Antiga: breve comentário



O texto abaixo é apenas uma introdução para o assunto que iremos estudar em sala de aula.

As Diversas Áfricas.
Há estudos historiográficos sobre pelo menos duas "Áfricas" bastante distintas. Uma é a da região do Egito, local de surgimento das primeiras sociedades complexas da humanidade. A outra é a que costumamos chamar de subsaariana, ou seja, aquela que se desenvolveu ao sul do deserto do Saara.
A África é o território terrestre habitado há mais tempo, e supõe-se que foi neste continente que a espécie humana surgiu. Os mais antigos fósseis de hominídeos encontrados na África(Tanzânia e Quênia) têm cerca de cinco milhões de anos. O Egito foi provavelmente o primeiro estado a constituir-se na África, há cerca de 5000 anos, mas muitos outros reinos ou cidades-estados se foram sucedendo neste continente, ao longo dos séculos. Para além disso, a África foi, desde a antiguidade, procurada por povos doutros continentes, que buscavam as suas riquezas, por vezes ocupando partes do “Continente Negro” por largos períodos. A estrutura atual de África, no entanto, é muito recente – meados do século XX – e resultou da colonização européia.

Proto-história de África
De acordo com as descobertas mais recentes de fósseis de hominídeos, a parte oriental da África(e Sudoeste da Ásia) parecem ter sido o suposto “berço único da humanidade”, não só onde, pela primeira vez, apareceu a espécie Homo sapiens, mas também grande parte dos seus antepassados, os Australopithecus (que significa “macacos do sul”), os Pithecanthropus (que significa “macaco-homem”) e, finalmente, o género Homo (ver Swartkrans, por exemplo).

No deserto da Líbia encontraram-se gravações em rochas (ou "petroglifos") do período Neolítico, e megalitos, que atestam da existência duma cultura de caçadores-recolectores nas savanas secas desta região, durante a última glaciação. O atual deserto do Saara foi um dos primeiros locais onde se praticou a agricultura na África (cultura da cerâmica de linhas onduladas). Outros achados arqueológicos demonstram que, depois da desertificação do Saara, as populações do Norte de África passaram a concentrar-se no vale do rio Nilo: os “nomas”, cuja cultura ainda não conhecia a escrita, e que, por volta de 6000 a.C., já tinha uma agricultura organizada.

África subsaariana
A África subsariana (português europeu) ou subsaariana (português brasileiro) corresponde à região do continente africano a sul do Deserto do Saara, ou seja, aos países que não fazem parte do Norte de África.
A palavra subsariana deriva da convenção geográfica eurocentrista, segundo a qual o Norte estaria acima e o Sul abaixo (daí o prefixo latino sub).
Efetivamente, o Deserto do Saara, com os seus cerca de 9 milhões de quilômetros quadrados, forma uma espécie de barreira natural que divide o continente africano em duas partes muito distintas quanto ao quadro humano e econômico. Ao norte encontramos uma organização sócio-econômica muito semelhante à do Oriente Médio, formando um mundo islamizado. Ao sul temos a chamada África Negra, assim denominada pela predominância nessa região de povos de pele escura.

Pode dizer-se que a história recente ou “moderna” da África, no sentido do seu registro escrito, começou quando povos de outros continentes começaram a registrar o seu conhecimento sobre os povos africanos – com excepção do Egito e provavelmente dos antigos reinos de Axum e Meroe, que tiveram fortes relações com o Egito.
Assim, aparentemente, a história da África oriental começa a ser conhecida a partir do século X, quando um estudioso viajante árabe, Al-Masudi, descreveu uma importante atividade comercial entre as nações da região do Golfo Pérsico e os "Zanj" ou negros africanos. No entanto, outras partes do continente já tinham tido início a islamização, que trouxe a estes povos a língua árabe e a sua escrita, a partir do século VII.
As línguas bantu só começaram a ter a sua escrita própria, quando os missionários europeus decidiram publicar a Bíblia e outros documentos religiosos naquelas línguas, ou seja, durante a colonização do continente, pelo menos, da sua parte subsaariana.
As primeiras civilizações surgiram na África na Antigüidade:
A partir do texto acima, responda as seguintes questões?
1 - Quando se fala na África, qual a primeira coisa que vêm à sua mente?
2 - Para você é importante o estudo da história da África? Por quê?
3 - Qual o legado africano no mundo atual?


Fontes: PILLETI, Nelson e PILLETI, Claudino. História e vida integrada. 5ª série. Ed. Ática, 2008.
Este post foi extraído do blog (soprahistoriar.blogspot.com), em 28/11/2008.

sábado, 23 de abril de 2011

UMA ODE AO ESTADO LAICO

Carta do Deputado Jean Wyllys - uma ode ao estado Laico

Em primeiro lugar, quero lembrar que nós vivemos em um Estado Democrático de Direito e laico. Para quem não sabe o que isso quer dizer, “Estado laico”, esclareço: O Estado, além de separado da Igreja (de qualquer igreja), não tem paixão religiosa, não se pauta nem deve se pautar por dogmas religiosos nem por interpretações fundamentalistas de textos religiosos (quaisquer textos religiosos). Num Estado Laico e Democrático de Direito, a lei maior é a Constituição Federal (e não a Bíblia, ou o Corão, ou a Torá).

Logo, eu, como representante eleito deste Estado Laico e Democrático de Direito, não me pauto pelo que diz A Carta de Paulo aos Romanos, mas sim pela Carta Magna, ou seja, pelo que está na Constituição Federal. E esta deixa claro, já no Artigo 1º, que um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana e em seu artigo 3º coloca como objetivos fundamentais a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. A república Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos princípios da prevalência dos Direitos Humanos e repúdio ao terrorismo e ao racismo.

Sendo a defesa da Dignidade Humana um princípio soberano da Constituição Federal e norte de todo ordenamento jurídico Brasileiro, ela deve ser tutelada pelo Estado e servir de limite à liberdade de expressão. Ou seja, o limite da liberdade de expressão de quem quer que seja é a dignidade da pessoa humana do outro. O que fanáticos e fundamentalistas religiosos mais têm feito nos últimos anos é violar a dignidade humana de homossexuais.

Seus discursos de ódio têm servido de pano de fundo para brutais assassinatos de homossexuais, numa proporção assustadora de 200 por ano, segundo dados levantados pelo Grupo Gay da Bahia e da Anistia Internacional. Incitar o ódio contra os homossexuais faz, do incitador, um cúmplice dos brutais assassinatos de gays e lésbicas, como o que ocorreu recentemente em Goiânia, em que a adolescente Adriele Camacho de Almeida, 16 anos, que, segundo a mídia, foi brutalmente assassinada por parentes de sua namorada pelo fato de ser lésbica. Ou como o que ocorreu no Rio de Janeiro, em que o adolescente Alexandre Ivo, que foi enforcado, torturado e morto aos 14 anos por ser afeminado.

O PLC 122 , apesar de toda campanha para deturpá-lo junto à opinião pública, é um projeto que busca assegurar para os homossexuais os direitos à dignidade humana e à vida. O PLC 122 não atenta contra a liberdade de expressão de quem quer que seja, apenas assegura a dignidade da pessoa humana de homossexuais, o que necessariamente põe limite aos abusos de liberdade de expressão que fanáticos e fundamentalistas vêm praticando em sua cruzada contra LGBTs.

Assim como o trecho da Carta de Paulo aos Romanos que diz que o “homossexualismo é uma aberração” [sic] são os trechos da Bíblia em apologia à escravidão e à venda de pessoas (Levítico 25:44-46 – “E, quanto a teu escravo ou a tua escrava que tiveres, serão das gentes que estão ao redor de vós; deles comprareis escravos e escravas…”), e apedrejamento de mulheres adúlteras (Levítico 20:27 – “O homem ou mulher que consultar os mortos ou for feiticeiro, certamente será morto. Serão apedrejados, e o seu sangue será sobre eles…”) e violência em geral (Deuteronômio 20:13:14 – “E o SENHOR, teu Deus, a dará na tua mão; e todo varão que houver nela passarás ao fio da espada, salvo as mulheres, e as crianças, e os animais; e tudo o que houver na cidade, todo o seu despojo, tomarás para ti; e comerás o despojo dos teus inimigos, que te deu o SENHOR, teu Deus…”).

A leitura da Bíblia deve ensejar uma religiosidade sadia e tolerante, livre de fundamentalismos. Ou seja, se não pratica a escravidão e o assassinato de adúlteras como recomenda a Bíblia, então não tem por que perseguir e ofender os homossexuais só por que há nela um trecho que os fundamentalistas interpretam como aval para sua homofobia odiosa.

Não declarei guerra aos cristãos. Declarei meu amor à vida dos injustiçados e oprimidos e ao outro. Se essa postura é interpretada como declaração de guerra aos cristãos, eu já não sei mais o que é o cristianismo. O cristianismo no qual fui formado – e do qual minha mãe, irmãos e muitos amigos fazem parte – valoriza a vida humana, prega o respeito aos diferentes e se dedica à proteção dos fracos e oprimidos. “Eu vim para que TODOS tenham vida; que TODOS tenham vida plenamente”, disse Jesus de Nazaré.

Não, eu não persigo cristãos. Essa é a injúria mais odiosa que se pode fazer em relação à minha atuação parlamentar. Mas os fundamentalistas e fanáticos cristãos vêm perseguindo sistematicamente os adeptos da Umbanda e do Candomblé, inclusive com invasões de terreiros e violências físicas contra lalorixás e babalorixás como denunciaram várias matérias de jornais: é o caso do ataque, por quatro integrantes de uma igreja evangélica, a um centro de Umbanda no Catete, no Rio de Janeiro; ou o de Bernadete Souza Ferreira dos Santos, Ialorixá e líder comunitária, que foi alvo de tortura, em Ilhéus, ao ser arrastada pelo cabelo e colocada em cima de um formigueiro por policiais evangélicos que pretendiam “exorcizá-la” do “demônio”.

O que se tem a dizer? Ou será que a liberdade de crença é um direito só dos cristãos?

Talvez não se saiba, mas quem garantiu, na Constituição Federal, o direito à liberdade de crença foi um ateu Obá de Xangô do Ilê Axé Opô Aforjá, Jorge Amado. Entretanto, fundamentalistas cristãos querem fazer uso dessa liberdade para perseguir religiões minoritárias e ateus.

Repito: eu não declarei guerra aos cristãos. Coloco-me contra o fanatismo e o fundamentalismo religioso – fanatismo que está presente inclusive na carta deixada pelo assassino das 13 crianças em Realengo, no Rio de Janeiro.

Reitero que não vou deixar que inimigos do Estado Democrático de Direito tente destruir minha imagem com injúrias como as que fazem parte da matéria enviada para o Jornal do Brasil. Trata-se de uma ação orquestrada para me impedir de contribuir para uma sociedade justa e solidária. Reitero que injúria e difamação são crimes previstos no Código Penal. Eu declaro amor à vida, ao bem de todos sem preconceito de cor, raça, sexo, idade e quaisquer outras formas de preconceito. Essa é a minha missão.

Jean Wyllys (Deputado Federal pelo PSOL Rio de Janeiro)

quinta-feira, 21 de abril de 2011

A Teoria de Darwin

 

Por Claudio Recco
Julho de 2008


Introdução

Foi em 1858 que Charles Darwin apresentou a teoria da seleção natural das espécies. Pela primeira vez na história um estudioso apresentava uma hipótese racional e materialista sobre a evolução e expunha um novo ponto de vista para a origem do ser humano, causando grande polêmica, na medida em que sua teoria se contrapunha ás teses teológicas, que atribuíam ao homem uma origem divina.
Darwin estudou teologia na Universidade de Cambridge e posteriormente embarcou no navio Beagle, rumo a América do Sul, passando ainda pela África do Sul, Austrália e Nova Zelândia, numa viagem de três anos, durante os quais observou que a fauna das distintas ilhas era similar, ainda que existissem variações muito significativas. Depois de um exaustivo trabalho empírico, supôs que as espécies não são imutáveis e que podem sofrer mudanças para sobreviver e se adaptar melhor ao meio.


Teoria


A partir de 1838 Darwin deu forma a uma teoria sobre a evolução dos seres vivos, incluindo a idéia de “seleção natural”, segundo a qual só sobreviviam os indivíduos de uma mesma espécie que sofriam mutações para se adaptar às mudanças da natureza, que eram incorporadas pelas gerações seguintes, possibilitando a continuidade de sua existência e sua evolução, incluindo os seres humanos.
No final de 1859, foi publicada a obra “A Origem das Espécies”, cuja primeira edição se esgotou num dia. As idéias apresentadas na obra criaram grande polêmica, que alcançou grande dimensão devido ao destaque dado pela imprensa, ampliando a repercussão fora do âmbito acadêmico. Apesar da agitação criada a partir da mídia, a comunidade científica valorizou suas idéias, que estavam bem argumentadas com uma sólida base de observações empíricas. A polêmica envolveu uma sociedade marcada pelo conservadorismo, determinado pela forte influência das concepções religiosas e do moralismo da época, que se recusava a aceitar sua visão científica.
Em 1871, Darwin publicou A origem do homem e a seleção natural. Ainda que a obra anterior - A origem das espécies - lhe parecesse suficiente para compreender a origem do homem e seu desenvolvimento, procurou satisfazer uma parte importante dos naturalistas que admitiam como princípio a seleção natural. Com essa nova obra, Darwin tratou de três problemas fundamentais. Primeiro: precede o homem, como qualquer outra espécie, de outra forma preexistente? Segundo: como ocorreu a evolução humana? Terceiro: como se explicam as diferenças entre os grupos humanos? Como Darwin receava inicialmente, a publicação da sua obra provocou intensas polêmicas por conta da hipótese de que o homem procedia de espécies inferiores e seu antepassado mais próximo era o macaco.


Era Vitoriana

A Rainha Vitória ascendeu ao trono inglês em 1837 e governou até 1901, quando faleceu. Esse perído ficou conhecido na história como “Era Vitoriana”, e foi caracterizado pela ascensão da classe média, pela moral conservadora, pelo intenso nacionalismo e por grande popularidade da soberana - uma época ainda de florescimento cultural e político, em que se amplia a participação dos cidadãos no governo.
Foi a época em que o imperialismo britânico se expandiu por todos os continentes, exercendo grande influência nos países americanos recém independentes da América – destacando-se a participação na organização da economia e da política externa do Brasil, como por ocasião da Guerra contra o Paraguai – da África à Oceania. Foi a época do Neocolonialismo, apoiado no poder econômico, militar, mas também nas teorias de superioridade do homem branco europeu, entendido como “cientifica” desde as teorias de Darwin, que foram usadas para sustentar a idéia de “missão civilizadora”. Era o “darwinismo social”.
Foi a época da intensa repressão aos movimentos sociais de populações afro-asiáticas, como a Guerra do Ópio, a Guerra dos Cipaios, a Guerra dos Boxers e a Guerra dos Bôeres. As vitórias inglesas garantiram a ampliação dos mercados aos produtos e capitais britânicos, que promoveram o enriquecimento da burguesia e possibilitaram ao Estado estender parte de seus ganhos a setores sociais até então marginalizados, assim como garantir direitos políticos e sociais para todas as camadas.
Essa situação de expansão econômica e de direitos se combinou com o discurso e comportamento puritanos da realeza, amparada pela Igreja Anglicana e assimilado pelo povo, que via positivamente o comportamento dos governantes, que deveriam ser tomados como modelo.


O ensino

Se entre os biólogos e os cientistas naturais a Teoria da Evolução é amplamente aceita e encontra pouca resistência, essa teoria ainda é de difícil compreensão para parcela significativa da população que, apesar de conhecer o trabalho de Darwin, a seleção natural e a evolução das espécies, conhece superficialmente, ou seja, de maneira preconceituosa e cheia de dúvidas. A falta de pesquisa e debate no ensino faz com que existam lacunas, situações não explicadas, portanto, não muito claras para os estudantes, que acham estranho ou desagradável descender de macacos e por isso passam a desconfiar, ou a não aceitar a Teoria da Evolução. Quando se ensina a Teoria Sintética da Evolução é necessário explicar corretamente os conceitos, para que se perceba que homens e macacos tiveram um ancestral comum, não exatamente um macaco, mas um primata”.


Criacionismo

Os criacionistas, grupo que apóia a visão bíblica de que Deus criou o mundo em seis dias há aproximadamente 6 mil anos, já investiram várias vezes contra a teoria de Darwin.
No entanto, nos últimos anos, os criacionistas deixaram de lado o discurso radical fundamentalista, tradicionalmente feito por religiosos que bradavam seus dogmas erguendo a bíblia, e os substituíram por uma teoria que se mostra mais racional e menos dogmática.
A Teoria do Plano Inteligente (IDT) é a forma de criacionismo mais recente, considerada mais sofisticada e que se apresenta com menor vigor religioso, preocupada em contestar a teoria evolucionista, utilizando um discurso científico. Essa teoria nasceu no Discovery Institute de Seattle, um centro conservador inaugurado em 1990. Os defensores modernos do criacionismo procuram se colocar no campo do debate científico, mas ao mesmo tempo se consideram como uma “ponte entre ciência e religião”, não escondendo a base religiosa da teoria em questão.
A mais recente polêmica ocorreu no Kansas (EUA), numa disputa jurídica quanto ao ensino sobre a origem da vida nas escolas. Nos últimos anos, numa séria de questões polêmicas – que incluí a eleição presidencial – nos Estados Unidos, e não apenas no debate sobre a criação, destaca-se a recuperação da influência do fundamentalismo religioso no país. No Brasil, a ex-governadora do Rio de Janeiro, Rosinha Garotinho, introduziu o ensino do criacionismo como obrigatório nas escolas estaduais. 

As raças não existem

As pesquisas genéticas confirmam o que historiadores e sociólogos já sabiam: a unidade da espécie humana. As raças não existem
Verônica Bercht

As ciências biológicas, assim como as ciências sociais, deram durante muito tempo estatuto científico ao racismo. Nelas, ele baseava-se especialmente na afirmação de que a espécie humana era composta de três grandes raças e cada uma delas tinha atributos intelectuais e comportamentais específicos que justificavam uma hierarquia biologicamente estabelecida. Quem pensava assim via na prática social a comprovação dessa hierarquia. O conceito de raça – ou subespécie – era, portanto, o alicerce científico para o passo seguinte, o racismo e seu corolário, a superioridade racial de um grupo privilegiado.


A principal pergunta pertinente às ciências biológicas sobre esta questão é: a espécie humana é, objetivamente, composta por raças diferentes? Respondida esta pergunta poderíamos então partir para a seguinte: uma raça é superior a outra?


Essas questões receberam respostas diferentes ao longo dos últimos 200 anos. Hoje, o desenvolvimento e o acúmulo dos conhecimentos sobre a evolução da espécie humana, fornecidos principalmente pela paleoantropologia e pela genética, estabeleceram provas irrefutáveis sobre a inexistência de raças na espécie humana e desmascararam a camisa de força imposta por cientistas para adequar a realidade à prática social e à ideologia.


Podemos identificar duas posturas bem marcadas em relação ao conhecimento científico. Uma delas considera o fato científico como a revelação da verdade. Assim, o experimento científico, ou descoberta, é apresentado como um fato isolado, sem relação com outros fatos, científicos ou não, e totalmente alheio ao desenvolvimento científico e histórico que o antecedeu, e o fato é então incorporado como uma “verdade” científica que, por sua vez, é cultuada como solução para o problema que suscitou a pesquisa.


No outro extremo estão os que percebem que as promessas feitas com base na “verdade científica” nem sempre se realizam; que sabem que a ciência é feita por homens e mulheres com suas ideologias, e que, hoje, a prática científica baseia-se nos mesmos mecanismos capitalistas que regem as sociedades atuais. Por isso, negam a validade da metodologia científica para a aproximação do conhecimento da realidade, que em última análise, para eles, é inalcançável.


Essas duas posturas, apesar de distintas, têm a mesma conseqüência: invalidam a prática científica como instrumento para o conhecimento da realidade, negam os benefícios que esse conhecimento pode representar para a humanidade e, acima de tudo, impedem a análise crítica da ciência atual. Com isso, esvaziam as propostas de luta para a democratização e socialização dos conhecimentos científicos e de suas aplicações e para a reorientação dos objetivos da prática científica, atualmente definidos pela organização capitalista e neoliberal da sociedade.
Para entendermos o estágio em que a ciência se encontra é necessário ter em mente que por trás de toda prática científica estão as idéias, que, por sua vez, são resultado do contato do homem com a natureza, com os outros homens e suas criações. As ciências biológicas não são exceção à regra. Elas também estão imersas no universo ideológico, e o debate sobre a existência de raças biologicamente definidas na espécie humana é uma demonstração de que a ciência e a ideologia são inseparáveis e de como é tortuoso o caminho que nos leva ao conhecimento da realidade. Mas, é, ao mesmo tempo, a demonstração de que a ciência pode nos dar elementos importantes para o entendimento do mundo em que vivemos e auxiliar na proposição de lutas para torná-lo mais justo e mais humano.
A origem da variedade de seres que habitam nosso planeta é uma questão fundamental das ciências biológicas. Elas têm, em sua origem, a concepção religiosa judaico-cristã que estabelecia a origem divina das espécies e, até 1858, quando Charles Darwin publicou A origem das espécies e a seleção natural, acreditava-se que elas eram fixas, criadas por Deus, e as variações entre os indivíduos de uma mesma espécie não passavam de imperfeições nas criaturas, provocadas pelas falhas do mundo material. Os mesmos argumentos explicavam a existência das raças humanas e estabeleciam os níveis hierárquicos entre elas. A versão bíblica (Gênesis 9, 18-27) conta que quando Noé e seus filhos Sem, Cam e Jafé saíram da Arca, Cam cometeu uma irreverência contra o pai que, para puni-lo, o condenou ao sofrimento no tórrido continente africano e à eterna escravidão: “Maldito seja Canaã! Que se torne o último dos escravos dos irmãos”. A descendência dos três filhos de Noé teria formado, segundo essa interpretação religiosa, as raças que se espalharam pelos diferentes continentes.
Essa concepção predominou nas ciências biológicas até mesmo depois de Darwin ter mostrado que as espécies não eram fixas, mas resultado de um longo processo de transformações sucessivas. Numa época em que, de um lado, a prática da escravidão estava no auge e, de outro, a ciência não dispunha de elementos para compreender a evolução humana – a paleoantropologia ainda engatinhava à procura de fósseis dos ancestrais humanos e não se conheciam os mecanismos de herança das características dos seres vivos – a ciência biológica européia, é bom lembrar, associava traços culturais que não conseguia entender à variedade física dos povos, alegando que eram determinados pelo clima onde esses povos viviam. Assim, os traços culturais dos povos asiáticos e africanos eram associados às suas características físicas e como essas culturas eram consideradas inferiores à cultura européia, que então procurava se impor nas diversas colônias, os povos mongolóides e negróides eram considerados inferiores.
Pode-se dizer que essas idéias predominaram nas ciências biológicas até o início do século XX, acaçapando as visões discordantes. O desenvolvimento de dois ramos das ciências biológicas, a paleoantropologia e a genética evolutiva, na primeira metade do século XX, e a ameaça representada pelas idéias nazistas e eugenistas durante a Segunda Guerra Mundial foram determinantes para destronar temporariamente aquela concepção no âmbito das ciências biológicas. E após a derrota do nazismo, mesmo biólogos conservadores, como Edward O. Wilson, um dos fundadores da sociobiologia, diziam que a noção de raça ou subespécie era tão arbitrária que deveria ser abandonada.
Não auxiliava na classificação de plantas e animais e nem no entendimento dos fenômenos evolutivos. Ao contrário, confundia-os.


A teoria neodarwinista, proposta na virada dos anos de 1940 por Ernst Mayr, Theodozius Dobzanky e Julian Huxley, reuniu a teoria da evolução proposta por Darwin com os achados de Mendel e as novi-dades da nascente genética das populações, mas ainda mantinha em suas bases o dogma da Criação. Aceitava a evolução das espécies como um processo progressivo em cuja base estão as espécies inferiores que gradativamente progridem até chegar ao ápice dominado pela figura humana, como se a evolução seguisse um plano previamente traçado. O neodarwinismo propõe que a evolução consiste no surgimento de novas variantes de genes em grupos isolados de uma espécie; essas variantes surgem ao acaso provocadas por mutações e não ocorrem de maneira homogênea em toda a espécie. Gradualmente, sob a ação da seleção natural, as variantes genéticas que conferem vantagens adaptativas aos indivíduos do grupo são incorporadas ao seu patrimônio genético. O isolamento e o acúmulo progressivo de mutações em seu patrimônio genético torna-o, ao longo do tempo, incompatível com a espécie original – definindo uma nova espécie. As raças ou subespécies, por sua vez, seriam os estágios intermediários desse processo.


Esta teoria não rompeu com as idéias racistas que, ao contrário, a evocavam para afirmar que as raças negra e amarela seriam estágios anteriores e inferiores da raça branca e inspirou correntes reacionárias, como a sociobiologia e o ultradarwinismo.


Mas o neodarwinismo expôs também a fragilidade do conceito de raça, subespécie ou variedade ao demonstrar como sua significância depende do momento do processo evolutivo de uma certa espécie. Como saber se as variações observáveis dentro de uma espécie dariam vantagens evolutivas aos seus portadores a ponto de diferenciá-los numa raça? Em que momento um conjunto de variações poderia conferir status de raça a uma população? Inspirou, também vários estudos que tentaram quantificar a variação genética entre populações de uma mesma espécie, inclusive na espécie humana. Esses estudos mostraram que a variação genética entre indivíduos de uma mesma população humana é menor do que a variação entre indivíduos de “raças” diferentes. Outros estudos demonstraram que os traços que orientam as noções de raças – a cor da pele, o formato do nariz e dos lábios e o tipo de cabelo – não são típicos de cada “raça”. Existem, por exemplo, pessoas de pele clara e pessoas de pele escura portadoras de cabelos crespos, ondulados e lisos; de nariz achatado e de nariz aquilino; de lábios finos ou carnudos. As variações genéticas para cada uma dessas características estão espalhadas em toda a população humana.

Raça, um conceito ideológico, e não biológico
A luta contra as idéias racistas foi intensa. Apesar dos avanços posteriores à Segunda Guerra Mundial, o debate sobre a existência de raças recrudesceu na década de 1970, quando foram publicados livros como O Macaco Nu, de Desmond Morris, Gene Egoísta de Richard Dawkins e Sociobiologia de Edward O. Wilson. As idéias racistas e deterministas dessas obras, fartamente divulgadas pela imprensa da época, foram atacadas por cientistas progressistas, de inspiração marxista, como Richard Lewontin, Steven Rose, Leon Kamin, Marcel Blanc, Stephen J. Gould, entre outros, que promoveram uma verdadeira campanha de divulgação de experimentos e pesquisas científicas e demonstraram como as idéias apresentadas por aqueles autores não tinham fundamentos científicos e eram, apenas, conclusões de ordem moral e ideológica.


Nessa época os livros do paleontólogo Stephen J. Gould começaram a chegar às livrarias mostrando que a teoria neodarwinista não era a única explicação para a origem de espécies novas. Uma das idéias combatidas por Gould é a de que as raças ou subespécies são estágios transitórios do processo de especiação. Ele é veemente no combate à idéia de que a evolução é um processo de “melhoramento” das espécies e de que há uma hierarquia entre elas. Ao contrário, ele defende que a seleção natural é um fator menor na origem das espécies e considera que o acaso é o principal motor da evolução. O acaso representado por catástrofes naturais, por alterações gradativas no ambiente, por mutações genéticas ou alterações mais profundas no material genético são responsáveis pelo desaparecimento da maior parte das espécies e pelo surgimento de novas.


Algumas idéias de Gould (muitas delas inspiradas em colegas que no início do século foram solapados pela força do neodarwinismo, como Richard Goldschmidt), foram reconhecidas e incorporadas por cientistas como Ernst Mayr, fundador do neodarwinismo.


Na segunda metade do século XX os achados de fósseis de ancestrais humanos acrescentaram novos argumentos contra a existência de raças ao mostrarem que a espécie humana é muito nova na face da Terra – surgiu há apenas cerca de 160 mil anos, tempo insuficiente para que houvesse se diferenciado em raças. Além disso, mostraram que o intercruzamento, ao contrário do isolamento, é uma característica da espécie impossibilitando a ocorrência do processo de especiação neodarwinista.


Atualmente, portanto, é consenso de que não existem raças biologicamente definidas entre os homens. Mesmo tendo destruído o conceito biológico de raça humana, não será a ciência que destruirá o racismo, cujas origens não são científicas e nem fazem parte da natureza humana. O racismo também não é um mero problema de atitude, um preconceito residual do tempo da escravidão, como a visão liberal tradicional deseja. As origens do racismo são ideológicas e suas bases se mantêm na medida em que o racismo reforça o sistema capitalista. As conclusões da paleoantropologia e da genética de populações, no entanto, devem ser incorporadas à luta contra o racismo com a mesma veemência que as conclusões pseudocientíficas o foram a seu favor em tempos de triste memória.


Verônica Bercht é bióloga e jornalista.
Texto da Revista Princípios ed. 79

TIRADENTES







BIOGRAFIA
Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes (Fazenda do Pombal, batizado em 12 de novembro de 1746Rio de Janeiro, 21 de abril de 1792) foi um dentista, tropeiro, minerador, comerciante, militar e ativista político que atuou no Brasil colonial, mais especificamente nas capitanias de Minas Gerais e Rio de Janeiro. No Brasil, é reconhecido como mártir da Inconfidência Mineira, patrono cívico do Brasil, patrono também das Polícias Militares dos Estados e herói nacional.
O dia de sua execução, 21 de abril, é feriado nacional. A cidade mineira de Tiradentes, antiga Vila de São José do Rio das Mortes, foi renomeada em sua homenagem.

Nascido em uma fazenda no distrito de Pombal, próximo ao arraial de Santa Rita do Rio Abaixo, à época território disputado entre as vilas de São João del-Rei e São José do Rio das Mortes, na Minas Gerais. O nome da fazenda "Pombal" é uma ironia da história: O Marquês de Pombal foi arqui-inimigo de Dona Maria I contra a qual Tiradentes conspirou, e que comutou as penas dos inconfidentes.
Joaquim José da Silva Xavier era filho do reinol Domingos da Silva Santos, proprietário rural, e da brasileira Maria Antônia da Encarnação Xavier (prima em segundo grau de Antônio Joaquim Pereira de Magalhães), tendo sido o quarto dos sete filhos.
Em 1755, após o falecimento de sua mãe, segue junto a seu pai e irmãos para a sede da Vila de São José; dois anos depois, já com onze anos, morre seu pai. Com a morte prematura dos pais, logo sua família perde as propriedades por dívidas. Não fez estudos regulares e ficou sob a tutela de um padrinho, que era cirurgião. Trabalhou como mascate e minerador, tornou-se sócio de uma botica de assistência à pobreza na ponte do Rosário, em Vila Rica, e se dedicou também às práticas farmacêuticas e ao exercício da profissão de dentista, o que lhe valeu o apelido (alcunha) de Tiradentes, um tanto depreciativa.
Com os conhecimentos que adquirira no trabalho de mineração, tornou-se técnico em reconhecimento de terrenos e na exploração dos seus recursos. Começou a trabalhar para o governo no reconhecimento e levantamento do sertão brasileiro. Em 1780, alistou-se na tropa da Capitania de Minas Gerais; em 1781, foi nomeado comandante do destacamento dos Dragões na patrulha do "Caminho Novo", estrada que servia como rota de escoamento da produção mineradora da capitania mineira ao porto Rio de Janeiro. Foi a partir desse período que Tiradentes começou a se aproximar de grupos que criticavam a exploração do Brasil pela metrópole, o que ficava evidente quando se confrontava o volume de riquezas tomadas pelos portugueses e a pobreza em que o povo permanecia. Insatisfeito por não conseguir promoção na carreira militar, tendo alcançando apenas o posto de alferes, patente inicial do oficialato à época, e por ter perdido a função de comandante da patrulha do Caminho Novo, pediu licença da cavalaria em 1787.
Morou por volta de um ano na cidade carioca, período em que idealizou projetos de vulto, como a canalização dos rios Andaraí e Maracanã para a melhoria do abastecimento de água no Rio de Janeiro; porém, não obteve aprovação para a execução das obras. Esse desprezo fez com que aumentasse seu desejo de liberdade para a colônia. De volta às Minas Gerais, começou a pregar em Vila Rica e arredores, a favor da independência daquela província. Fez parte de um movimento aliado a integrantes do clero e da elite mineira, como Cláudio Manuel da Costa, antigo secretário de governo, Tomás Antônio Gonzaga, ex-ouvidor da comarca, e Inácio José de Alvarenga Peixoto, minerador. O movimento ganhou reforço ideológico com a independência das colônias estadunidenses e a formação dos Estados Unidos da América. Ressalta-se que, à época, oito de cada dez alunos brasileiros em Coimbra eram oriundos das Minas Gerais, o que permitiu à elite regional acesso aos ideais liberais que circulavam na Europa.


Legado de Tiradentes perante a história do Brasil

Tiradentes permaneceu, após a Independência do Brasil, uma personalidade histórica relativamente obscura, dado o fato de que o Brasil continuou sendo uma monarquia após a independência do Brasil, e, durante o Império, os dois monarcas, D. Pedro I e D. Pedro II, pertenciam à casa de Bragança, sendo, respectivamente, neto e bisneto de D. Maria I, contra a qual Tiradentes conspirara, e, que havia emitido a sentença de morte de Tiradentes e comutado as penas dos demais inconfidentes. Durante a fase imperial do Brasil, Tiradentes também não era aceito pelo fato de ele ser republicano. O "Código Criminal do Império do Brasil", sancionado em 16 de dezembro de 1830, também previa penas graves para quem conspirasse contra o imperador e contra a monarquia:


"Art. 87. Tentar diretamente, e por fatos, destronizar o Imperador; privá-lo em todo, ou em parte da sua autoridade constitucional; ou alterar a ordem legítima da sucessão. Penas de prisão com trabalho por cinco a quinze anos. Se o crime se consumar: Penas de prisão perpétua com trabalho no grau máximo; prisão com trabalho por vinte anos no médio; e por dez anos no mínimo."
Tiradentes Esquartejado, em tela de Pedro Américo (1893) - Acervo: Museu Mariano Procópio.

Foi a República – ou, mais precisamente, os ideólogos positivistas que presidiram sua fundação – que buscaram na figura de Tiradentes uma personificação da identidade republicana do Brasil, mitificando a sua biografia. Daí a sua iconografia tradicional, de barba e camisolão, à beira do cadafalso, vagamente assemelhada a Jesus Cristo e, obviamente, desprovida de verossimilhança. Como militar, o máximo que Tiradentes poder-se-ia permitir era um discreto bigode. Na prisão, onde passou os últimos três anos de sua vida, os detentos eram obrigados a raspar barba e cabelo a fim de evitar piolhos. Também, o nome do movimento, "Inconfidência Mineira", e de seus participantes, os "inconfidentes", foi cunhado posteriormente, denotando o caráter negativo da sublevação – inconfidente é aquele que trai a confiança. Outra versão diz que por inconfidência era termo usado na legislação portuguesa na época colonial e que "entendia-se por inconfidência a quebra da fidelidade devida ao rei, envolvendo, principalmente, os crimes de traição e conspiração contra a Coroa", e, que para julgar estes crimes eram criadas "juntas de inconfidência".
Historiadores como Francisco de Assis Cintra e o brasilianista Kenneth Maxwell procuram diminuir a importância de Tiradentes, enquanto autores mineiros como Oilian José e Waldemar de Almeida Barbosa procuram ressaltar sua importância histórica e seus feitos, baseando-se, especialmente, em documentos sobre ele existente no Arquivo Público Mineiro.
Atualmente, onde se encontrava sua prisão, funcionou a Câmara dos Deputados na chamada "Cadeia Velha", que foi demolida e no local foi erguido o Palácio Tiradentes que funcionava como Câmara dos Deputados até a transferência da capital federal para Brasília. No local onde foi enforcado ora se encontra a Praça Tiradentes e onde sua cabeça foi exposta fundou-se outra Praça Tiradentes. Em Ouro Preto, na antiga cadeia, hoje há o Museu da Inconfidência. Tiradentes é considerado atualmente Patrono Cívico do Brasil, sendo a data de sua morte, 21 de abril, feriado nacional. Seu nome consta no Livro de Aço do Panteão da Pátria e da Liberdade, sendo considerado Herói Nacional.

Fonte: Wikipedia

terça-feira, 19 de abril de 2011

19 de abril: Dia do Índio


Às lutas do povo brasileiro teve início com o índio contra o invasor europeu. A cultua indígena foi desarticulada em nome da ideologia e da geopolítica das classes dominantes, fundamentada nos princípios mercantilista do século XVI.

Sob a luz espiritual da cristandade, a Igreja Católica facilitou a colonização europeia servindo o índio ao opressor. Explicada pela visão dos vencedores, a colonização se fez necessária uma vez que, os primeiros brasileiros representavam o atraso. A ideologia dominante justificou o extermínio dos índios e a ocupação de suas terras "como necessário para o progresso do Brasil", enfatiza Júlio José Chiavenato.


Com a chega dos navegantes d'além-mar, desencadeia-se "uma guerra biológica implacável". Com isso, vinheram as enfermidades ( à bexiga, á coqueluche, à tuberculose, o sarampo etc) trazidas pelo homem branco que se transformaram em "pestes mortais", bem como às "guerras de extermínio e da escravização" provocando, assim, a dizimação ou o "extermínio genocída e etnocída" dos grupos indígenas. Assim sendo, o plano de colonização foi no dizer de Darcy Ribeiro: "Um somatório de violência mortal, de intolerância, prepotência e ganância". À guerra de extermínio provocou a eliminação de vários povos. Visando universalizar a Igreja cristã no Novo Mundo (na América Portuguesa), era necessário, segundo o projeto católico da época, converter os índios pagãos em cristãos dementes, adoradores de Deus.

Os gentios eram vistos como animais ferozes e praticantes da antropofagia. Para os índios, a antropofagia é vista como um rito mágico. Acreditavam que "comendo dos músculos de um lutador adquiria sua força ou comendo os pés de um bom corredor adquiria sua velocidade".

Antes da invasão dos europeus, eram cerca de 5 milhões de índios, hoje só restam aproximadamente 350 mil indígenas, submetidos ao jugo do homem branco. É sintomático, que uma historiografia servil ao poder, sem uma visão crítica dos fatos enalteça e glorifique os bandeirantes como heróis nacionais.
Antes da chegada dos invasores portugueses as terras brasileiras, os números relatios aos índios que aqui viviam eram cerca de 5 milhões de nativos. Hoje, esse número não ultrapassa de 330 mil índios. É visível, a situação de miséria e abandono em que vivem os índios no campo ou nas cidades. Fora do convívio tribal, eles passam a ingressar a fileira dos marginalizados e excluídos e passam a fazer parte da camada social mais pobre do país.

Em síntese, a miopia colonizadora e a visão tradicional de alguns historiadores não foram capazes de apreender o processo de desenvolvimento social do ser humano, isto é, explicar o papel das três "raças" como agentes do contexto histórico. Enquanto não reconhecer como grupos humanos (etnicos), que se tente resgatar verdadeira historicidade. Assim, as lutas do povo brasileiro tem importância ímpar na história do Brasil.


Por Lima Júnior.

sábado, 16 de abril de 2011

Sobre as origens da História

Existem interessantes polêmicas sobre se a origem da História teria se dado a partir de um desdobramento da Filosofia ou de um desdobramento da Poesia. Charles Norris Cochrane (1889-1945), por exemplo, em seu ensaio Cristandade e Cultura Clássica (1944, cap.12), irá conceber a História proposta por Heródoto como um desdobramento do desenvolvimento da filosofia grega (ele acredita ser possível propor a hipótese de que Heródoto havia sido discípulo de Heráclito; e, de certa maneira, não seria mesmo possível encontrar tutor filosófico mais apropriado para esta ciência do devir humano). Por outro lado, a Mitologia autoriza a encetar uma aproximação entre a História e a Poesia. Ambas – Clio e Erato – eram musas, e filhas de Mnemosine (a “Memória”). É também na mesma categoria que Aristóteles dispõe a tarefa do Historiador e a tarefa do Poeta, pois ambos teriam seus olhos e sensibilidades voltados para a Práxis – isto é, para as “ações humanas” – e cada um a seu modo teria por responsabilidade fazer perdurarem estas ações. Sem o historiador e o poeta, capazes de assegurar a recordação dos grandes feitos e a presentificação das belas ações através da invenção poética, tudo aquilo que se refere ao mundo da Práxis deixaria de existir no instante imediato à realização das ações, sem deixar quaisquer vestígios. Desta maneira, tanto a História como à Poesia teriam por referência este mundo das ações humanas, ao contrario da Filosofia, que se volta para o mundo da Theoria (contemplação das coisas que pairam acima do homem).

Hannah Arendt, aliás, desenvolve uma brilhante digressão sobre o tema: antes mesmo de Heródoto, a História aparece como uma realidade imaginada no interior da poesia grega. “Poeticamente, seu início encontra-se no momento em que Ulisses, na corte do rei dos Feácios, escutou a estória dos seus próprios feitos e sofrimentos, a estória de sua vida, agora algo de fora dele próprio, um ‘objeto’ para todos verem e ouvirem. O que fora pura ocorrência torna-se agora ‘História’” (ARENDT, 2009, p.74)


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Este pequeno trecho foi extraído de uma nota do primeiro capítulo do 'Volume II' de Teoria da História (p.32). No primeiro volume da série (capítulo 1), também é desenvolvido um capítulo mais extenso que principia por discutir a formação dos campos disciplinares, de maneira geral, e que toma a História como um dos exemplos (BARROS,José D'Assunção.Teoria da História, volume I: Princípíos e Conceitos Fundamentais. Petrópolis: Editora Vozes. 2011, p.17-40).

Fonte: Rede Histórica, em 10/04/2011.