Ao visitar um tio em um hospital psiquiátrico, fiquei pasme com as imagens deploráveis de homens e mulheres decaídos por um conjunto de psicoses endógenas. Criaturas dissociadas da ação e do pensamento, expressando uma sintomatologia variada, presos aos delírios persecutórios, alucinações, labilidade afetiva etc. Assim, encontrei em cada um daqueles que lá se encontravam mundos completamente distintos, porém ligados pela mesma dor (a loucura). Mundos, onde o trágico parece se constituir em elemento essencial a suas vidas. Pois, a infelicidade e as desventuras sucedem cotidianamente.
Deste modo, compreendo o quanto a felicidade é algo difícil de encontrar quando nos encharcamos com os “erros funestos da vida inteira”. Afinal, nosso mundo é senão o inferno de Dante Alighieri, em sua Divina Comédia. Em lugar das alegrias do Paraíso, temos a nossa volta as ‘dores’ e as ‘misérias’ desenhadas na página infinita do espaço e do tempo. Portanto, me pego a perguntar: Porque o desejo e o sofrimento caminham lado a lado, desenvolvendo-se sem limites? Porém, aquelas “almas desvalidas”, na sua maioria desprotegida, desamparada, estão entregue a própria sorte.
Por um instante, mergulhei no universo introspectivo dos que estavam a minha volta e percebi o próprio íntimo, os sentimentos e as reações de cada um. O estabelecimento psiquiátrico, no qual “Tio Chico” estava inserido, parecia mais uma nau de insensatos, repletos de homens e mulheres absorvidos por uma confusão mental, onde os argumentos desconexos provoca uma perturbação interior. Por um desvio de rota, esses “seres” ficam sem rumo, sem direção levados por inteiro pelas tempestades e correntezas da vida diária. Seria essa ‘nau’, aquela descrita por Michel Foucault em sua História da Loucura? Onde observa que: “A Nau dos Loucos atravessa uma paisagem de delícias onde tudo se oferece ao desejo, uma espécie de Paraíso renovado, uma vez que nela o homem não mais conhece nem sofrimento nem a necessidade” (2008, p.21).
Contudo, a loucura não pode ser vista como algo assombroso, ou seja, “[...] a loucura não está ligada ao mundo e a suas formas subterrâneas, mas sim ao homem, a suas fraquezas, seus sonhos e suas ilusões”, ressalta Foucault (2008, p.24).
Por um momento, fechei os olhos e vi que por entre ruas escuras — do mundo imaginário e simbólico daquelas pessoas —, caí o amor dos homens em fontes profundas. Eis, ali, o afã que cavalga o presente futuro. Corações endurecidos, sórdidos e velhos invadem os jardins, onde o vento das alturas desprendem açoites que condicionam em nós o abrasamento das fogueiras vivas. Adiante, vi que dos passos sem ritmo, brota da alma, um corpo febril, símbolo e expressão de si mesmo. Que desterra de cânticos sagrados, o bem e o mal. E, arrebanha da obscuridade da sombra noturna a natureza humana. A manhã que está oculta, à tarde que se descobre. Assim, nos arrastamos sobre duros ombros e somos tolhidos pela, mormente cotidianidade. Submersos num pântano obscuro, os loucos, os insensatos e os delirantes “tenta em vão subir uma colina luminosa”... Ajudem-nos!
A discriminação e o preconceito são formas de atitudes que vem sendo largamente usada para “rejeitar comportamentos”, violentando o convívio humanizado.
Não é fácil imaginar, a vida dos pacientes esquizofrênicos mergulhados ao isolamento nos manicômios, por mais que os métodos psiquiátricos tenham avançado. A negligência familiar e estatal tem provocado um “verdadeiro paroxismo de dor”.
O doente mental não pode ser visto com espanto, algo terrível. Preso a loucura, homens e mulheres são atingidos por um pesadelo permanente. Pessoas que tem como únicos patrimônios os ciclos da natureza: o nascimento e a morte.
Dizer não a quem necessita de ajuda, aos que vivem fora da realidade, parece-me ser um procedimento primitivo e irracional. A reumanização do tratamento dos esquizofrênicos é algo que deve ser feito, assim com a assistência à família do paciente para que a vida dos parentes dos pacientes esquizofrênicos não seja impedida de se desenvolver por causa da esquizofrenia.
Portanto, o isolamento social não é a saída para quem não consegue diferenciar bem o mundo real do irreal. Aproximá-los, para um convívio humanizado seria o correto. O esquizofrênico, louco ou insensato, insano, doido ou delirante, como se costuma dizer, é capaz de ser feliz apesar da doença.
José Lima Dias Júnior
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