Posted: 27 Oct 2011 01:00 AM PDT
Por: Túlio Madson
Vivemos em uma época onde o que está em jogo não é apenas o destino individual ou de cidades, estados e nações, mas o destino da humanidade. Não é um privilégio estar vivo nessa época, é uma responsabilidade.
É uma mudança global, mas cada foco de mudança deve estar de acordo com seu contexto regional, devemos mudar nossa realidade à partir dela mesma, não de um modelo já pronto. Não precisamos substituir nosso modelo, precisamos readequá-lo, para tanto, temos que estar dentro dele.
É bem capaz de que caso a profecia maia se concretize e o céu desabe no próximo ano, estejamos até o último momento à mercê de sujeitos que continuariam jogando o jogo político, com sua típica petulância e conflitos de ego, mesmo nos momentos mais calamitosos. Porque é apenas que assim funciona nosso sistema político.
Se quisermos muda-lo temos que passar pelo processo representativo, mas não tenhamos a ilusão de que políticos do tipo déspotas-esclarecidos irão aparecer e nos entregar um novo modelo. Temos que exigir, constranger, pressionar, fiscalizar, ou no mínimo se inteirar das ações tomadas por aqueles que dizem nos representar.
Se gerações que nos precederam deram tanto de si para que vivêssemos em um sistema representativo – ainda que não completamente democrático, não podemos agora desacreditar de tudo e nos resignar da política. Isso é o que deseja ardentemente todo corrupto nesse país: que todos tenham a impressão de viver em um sistema completamente corrompido ou de que todo político é corrupto, assim eles não ficam em evidência e tornam-se apenas mais um no meio de tantos.
Devemos antes de tudo nos reconhecer dentro desse sistema. Culpar os eleitos tornou-se uma forma de isentar de culpa os eleitores. Não somos vítimas deles, somos vítimas de um modelo de sociedade que não dá importância à conscientização política, produzindo com isso analfabetos políticos. A política torna-se assim a atividade de uma classe da qual somos estranhos. Isso nos leva a impressão de que não fazemos parte da política, quando na verdade somos – ou deveríamos ser – seu elemento primordial, uma vez que nós legitimamos com nossa resignação a manutenção desse modelo.
A noção de que devemos “lutar” contra a corrupção também se insere no jogo político: de jogar homens contra homens, partido contra partido, ego contra ego. Se quisermos combater a corrupção, não temos que eleger inimigos específicos encarnados em partido A ou B, porque a corrupção não se materializa em indivíduos ou em instituições, ela é um desvio de caráter, no qual estamos todos sujeitos em maior ou menor grau. Nosso inimigo é o modelo que propicia ou facilita que pessoas sejam corrompidas em grande escala, ou que atos de corrupção sejam retribuídos com impunidade. E isso não se resolve atacando tal pessoa ou instituição.
Lutar nem sempre é conquistar, cabe-nos ressaltar isso, devemos antes de tudo repensar o modo como entendemos o processo de “luta”. Pois, aquele que se dedica a tomar conhecimento das falhas do modelo, luta mais contra ele do que aquele que se limita a substitui-lo por outro já pronto, fruto de uma visão específica de um determinado grupo. Mais do que lutar precisamos nos conscientizar, o conhecimento também é uma forma de atuação política. Temos que combater o modelo por dentro, ajustando suas falhas ao invés de lutar para dar um “reset” em tudo e implantar outro com a simplicidade de quem faz um download. A mudança virá mais com ações ponderadas, planejadas, debatidas, do que com o frenesi do espírito revolucionário.
O conhecimento é a mais poderosa arma política, capaz de produzir as mais drásticas mudanças, a principal via de transformação social. Contudo, as lideranças não se interessam em compartilha-lo, ao contrário, adotam o discurso do “sigam-me então eu vos direi a verdade”, ou seja, o conhecimento torna-se uma ferramenta de persuasão. A crítica ao modelo torna-se assim personificada em uma pessoa ou em um partido, quando na verdade deveria ser um projeto compartilhado, um desejo que não se resumisse ou se limitasse a um segmento. Deveria ser uma luta sem rosto, que estivesse presente em todo o sistema e não em “parte” dele.
Uma população consciente, bem educada, com uma sólida formação política, sabe trilhar seu rumo sem a necessidade de lideranças. Mas enquanto essa sociedade existir apenas em nossos desejos, temos que acompanhar o jogo político para que não vire um jogo de egos pessoais, ideológicos ou institucionais, e sim um palco onde se faz presente o embate de ideias e ideais não de personalidades ou instituições.
Aqueles que fazem apenas do processo de luta – e não de sua finalidade – seu ideal de vida, na verdade é um grande criador de dificuldades, é aquele propenso a ressentimentos, que se diverte com as derrotas alheias, defende seu grupo por um sentimento de exclusivismo e não necessariamente pela afeição e fraternidade com os membros que o compõem. Onde quer que este indivíduo se manifeste estará promovendo toda uma gama de tensões, orgulhos feridos e competições injustificáveis.
Nossas instituições e partidos políticos – com as devidas exceções – parecem não se ater a ideias, conceitos, visões de mundo, mas tão somente a prática de induzir seus afiliados a serem “fiéis”, bons partidários, a hostilizar o lado oposto, a estarem sempre prontos e dispostos para o embate como galos de briga nas mãos de alguns.
É óbvio que precisamos dos partidos e dos partidários, é inegável sua importância como agentes provocadores de mudança, mas não devem ser os únicos, não devemos restringir a eles todo o clamor por mudanças que emana em nosso tempo, temos que assumir nosso papel, eles têm que representar nossos anseios não guia-los.
Em contrapartida, não sejamos inocentes em acreditar que as coisas irão simplesmente mudar por si só, que um dia acordaremos e veremos pessoas bem formadas, críticas, politicamente ativas vivendo em um mundo sustentável. É preciso induzir essa mudança, e nesse sentido sim: lutar por ela. Mas a luta deve ser um meio, não um fim. Antes de lutar, de protestar, ou até de nos questionar sobre os modos de luta, temos que saber o motivo pelo qual estamos lutando, para daí sim adequar cada um a seu modo o esforço que julga necessário para obter a finalidade desejada.
Precisamos de uma meta antes da luta, e essa meta deve ser construída com um diálogo amplo e irrestrito que agregue todas as classes, crenças, ideologias, que esteja muito além de partidos, entidades ou pessoas, que seja um diálogo agregador e não segregante, que advenha mais da conciliação do que da luta.
E esse passo ainda precisa ser dado.
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