sexta-feira, 30 de dezembro de 2011



Encerrando as atividades de 2011

Para compreender Lampião...
Por: José Lima Dias Júnior*


O caso da Grota do Angico em 1938, não pode ser desvalorizado ou ignorado. Nesse caso, as respostas para essa questão dependem de “pressupostos tácitos”. Embora seu conteúdo esteja sendo sempre aperfeiçoado. A História ou outras formas de conhecimento (Sociologia, Antropologia, Geografia, etc.) está claramente muito mais perto de novas descobertas do que as afirmações tendenciosas, exageradamente dogmáticas, que causam danos à ciência.

Quanto aos eventos históricos e o cuidado que o historiador (bem como, outros pesquisadores) deve ter, vejamos o que escreveu o filosofo romano Cícero (106 a.C. – 43 a.C.): A primeira lei é que o historiador jamais deve se atrever a registrar o que é falso; a segunda, que jamais deve se atrever a ocultar a verdade; a terceira, que não deve haver suspeitas de favoritismo ou preconceito na sua obra.

Mas, pelo que me é dado observar, permitir o suborno e a corrupção como meio de vida, já era na época do cangaço, um hábito comum. Lampião estava muito à frente do seu tempo. Opôs-se corajosamente à máquina estatal, quando fora perseguido pelas forças policiais de sete estados nordestinos. Porém, aliou-se aos “coronéis”, aos líderes políticos como forma de sobrevivência, daí seu lado estrategista. Como não era um revolucionário, tampouco foi motivado pelo desejo de perpetuar os interesses da classe social em que nasceu, bem como não fizera oposição à tirania.


Por Rogério Dias

No curso natural da história, vemos um conjunto de informações (artigos, teses, livros etc.) serem abatidas “pelas armas dos novos fatos”. Colocar a figura de Virgulino Ferreira da Silva associada ao “banditismo social” é algo grotescamente mal empregada, uma vez que não podemos explicar suas práticas criminosas invocando tal fenômeno, muito menos justificar seu lado sanguinário. Assim como, não deixa bem claro que possuía características muito menos cruéis.

Certamente podemos exercer algum arbítrio quanto aos diferentes tipos de práticas condenáveis e modus operandi do “rei do cangaço”, contudo não deve ser decisões tomadas de qualquer modo, isto é, presa as conjecturas e a subjetividade. Quanto a mim, não quero dizer às pessoas que elas devem pensar, nem impor meu pensamento. O que tento observar, é que não podemos nos submeter a uma visão limitada, ou seja, a um pensamento imaginário e fantasioso. Precisamos, sim, de uma explicação baseada no conhecimento, mas que na vontade. Mesmo, sabendo que não existe uma verdade absoluta.

Para quem conhece um pouco da história do cangaço (neste caso sou um principiante), não podemos começar a apoiar teorias e opiniões que são obviamente absurdas, quanto as que procuram explicar o cangaço, enquanto fenômeno social.


Por Rosina Becker Do Valle

Como nordestino Lampião se pautou na superstição, nas crendices, no misticismo. As hierarquias sociais, a ausência do Estado, a questão da honra entre outras parecem adequadas para explicar o ingresso de Lampião à vida errante. Ainda sim, parece muito justo quando encontramos alguns pesquisadores apontarem que Lampião era um indivíduo sem compaixão, impiedoso, “cangaceiro infame, matador do mal, lei do sertão”, etc. Foram as circunstâncias que levaram Virgulino a enveredar pelo caminho do crime. Dessa forma, Lampião se favoreceu de alguns aspectos (corrupção, relação amistosa entre coiteiros e policiais, etc.) a adaptação na luta pela existência.

De herói a vilão, Lampião está presente no imaginário popular. A hipótese do envenenamento, no fatídico 28 de julho de 1938, não aceita por alguns estudiosos do cangaço, não mostra que a evidência seja escassa e até nula.

Com raízes no século XIX, o estudo do cangaço não deve ser visto ou atacado como“meras opiniões subjetivas” ou algo que não pode ser questionadas. O perigo da subjetividade e do preconceito tem sido perceptível desde o começo da história, observa Carl Sagan (O mundo assombrado pelos demônios: a ciência vista como uma vela no escuro. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 292). Não quero, aqui, abraçar o solipsismo, que a única realidade é os meus próprios pensamentos.


Por Eduardo Lima

O fenômeno do cangaço não deve ser visto como algo demasiadamente simples, ingênuo, mas, algo que parece ser bastante complexo. As engrenagens deste fenômeno se entrecruzam, onde as partes componentes se complementam. Contudo, talvez seja necessário algum fato histórico não descoberto para compreender o universo lampiônico.

Não que todas as tentativas para explicar o evento da Grota do Angico têm falhado. Entretanto, é tão complexo e estranho que ainda não podemos compreendê-los.


O Fantasma de Lampião - Por Alexandre Fiuza

Se conhecermos a maior aproximação possível da verdade e não conservarmos os interesses de grupos, teremos condições de não repetir os erros cometidos no passado. O evento que culminou com a morte do maior ícone do cangaço são, assim como outras questões sujeitas à refutação, que precisam de uma ampla revisão.

É essencial para muitas outras ciências, a veracidade dos fatos. Não se pode fazer ou produzir conhecimento pautado no “achismo”. A História é um campo de possibilidades. Entretanto, a pseudociência não nos ajuda em nada. Diante do exposto, vejamos a observação de Carl Sagan (2006, p.305) acerca da ciência:


Por Ana Miranda

A ciência é diferente de muitos outros empreendimentos humanos — evidentemente não pelo fato de seus profissionais sofrerem influência da cultura em que se criaram, nem pelo fato de ora estarem certos, ora errados ( o que é comum a toda atividade humana), mas pela sua paixão de formular hipóteses testáveis, pela sua busca de experimentos definitivos que confirmem ou neguem as ideias, pelo vigor de seu debate substantivo e pela sua disposição a abandonar as ideias que foram consideradas deficientes. Porém, se não tivéssemos consciência de nossas limitações, se não procurássemos outros dados, se nos recusássemos a executar experimentos controlados, se não respeitássemos a evidência, teríamos muito pouca força em nossa busca da verdade. Por oportunismo e timidez, poderíamos ser então fustigados por qualquer brisa ideológica, sem nenhum elemento de valor duradouro a que nos agarrar.


Por Totonho Laprovitera

Prezado Kiko,
Tomei a liberdade de enviar esse texto como forma de reconhecimento do belíssimo trabalho executado pelo "Lampião acesso", o que torna possível acreditar na pesquisa e na ciência como forma de compreender o que está na nossa volta.
 Atenciosamente,
 José Lima Dias Júnior
 Mossoró, 28 de dezembro de 2011.

*Graduado em História pela UERN. Leciona na Rede municipal de ensino na "Cidade de Quatro Torres".

Fonte: lampiaoaceso.blogspot.com

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

O tráfico de seres humanos hoje

edição 66 - Abril 2009
O tráfico de seres humanos hoje
Mais de 200 anos após a proibição do comércio negreiro, milhões de pessoas ainda são compradas e vendidas todos os anos no mundo inteiro
por Leonardo Sakamoto
LEONARDO SAKAMOTO
Ação de libertação de escravos em fazenda no município de Goianésia do Norte, no Pará, em novembro de 2003
Migrar e trabalhar. Quando esses verbos se conjugam da pior forma possível, acontece, ainda hoje, o chamado tráfico de seres humanos. Um relatório da Organização Internacional do Trabalho, publicado em 2005, estima em cerca de 2,5 milhões o número de pessoas traficadas em todo o mundo, 43% para exploração sexual, 32% para exploração econômica e 25% para os dois ao mesmo tempo. No caso do tráfico para exploração econômica, a negociação de trabalhadores rende por ano cerca de US$ 32 bilhões no mundo.

O tráfico de pessoas para exploração econômica e sexual está relacionado ao modelo de desenvolvimento que o mundo adota. Esse modelo é baseado em um entendimento de competitividade que pressiona por uma redução constante nos custos do trabalho. Empregadores “flexibilizam” as leis e relações trabalhistas para lucrar e, ao mesmo tempo, atender aos consumidores, que exigem produtos mais e mais baratos. No passado, os escravos eram capturados por grupos inimigos e vendidos como mercadoria. Hoje, a pobreza que torna populações socialmente vulneráveis garante oferta de mão-de-obra para o tráfico – ao passo que a demanda por essa força de trabalho sustenta o comércio de pessoas. Esse ciclo atrai intermediários, como os “gatos” (contratadores que aliciam pessoas para ser exploradas em fazendas e carvoarias); os “coyotes” (especializados em transportar pessoas pela fronteira entre o México e os Estados Unidos) e outros “animais”, que lucram sobre os que buscam uma vida mais digna.
   
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Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em ciência política pela Universidade de São Paulo. Membro da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, é autor do livro Trabalho escravo no Brasil do século XXI (OIT, 2006) 

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

O homem de Neandertal pensava como nós? Parte I.

O arqueólogo João Zilhão defende a tese de que nossos parentes, de reputação intelectual duvidosa, compartilhavam as mesmas aptidões cognitivas

Por João Zilhão
Há duas décadas, o arqueólogo português João Zilhão, da University of Bristol, na Inglaterra, estuda nosso primo mais próximo, o homem de Neandertal, que ocupou a Eurásia por mais de 200 mil anos antes de desaparecer misteriosamente há cerca de 28 mil anos. Especialistas da área debatem há tempos eventuais semelhanças entre a cognição do homem de Neandertal e a nossa. Em posição central nessa controvérsia estão alguns sítios neandertais contendo restos culturais indicativos do uso de símbolos – inclusive jóias – que são um elemento determinante do comportamento humano moderno. Zilhão e outros argumentam que o homem de Neandertal inventou sozinho essas tradições simbólicas, antes de os seres humanos ditos modernos, do ponto de vista anatômico, terem chegado à Europa, há cerca de 40 mil anos. Os críticos, por outro lado, acreditam que esses objetos tiveram sua origem entre os modernos.

No entanto, em artigo publicado em janeiro na Proceedings of the National Academy of Sciences, nos Estados Unidos, Zilhão e seus colegas relataram descobertas que poderiam encerrar a polêmica: conchas marinhas manchadas de pigmentos, de dois sítios na Espanha datados de quase 50 mil anos atrás – 10 mil anos antes de os homens ditos modernos do ponto de vista anatômico terem se dirigido à Europa. Recentemente, Zilhão discutiu as implicações das novas descobertas de sua equipe com a editora Kate Wong, da Scientific American. Segue uma versão editada dessa conversa.

SCIENTIFIC AMERICAN: Paleoantropólogos debatem o comportamento dos homens de Neandertal há décadas. Por que todo esse alvoroço agora?

JOÃO ZILHÃO: O debate dos últimos 25 anos decorre da teoria pela qual os homens com anatomia moderna se originaram, como uma nova espécie, na África e depois se espalharam a partir dali, substituindo os homens primitivos como os de Neandertal. Aliado a essa noção, havia o princípio de que as espécies são defi nidas tanto por sua anatomia quanto pelo comportamento. Dessa forma, os homens de Neandertal, por não terem uma anatomia moderna, não poderiam, por defi nição, ser moderno em seu comportamento.

Porém, havia problemas com esse modelo. Em 1979, arqueólogos que trabalhavam no sítio em St. Césaire, na França, encontraram um esqueleto neandertal em uma camada que continha resquícios culturais produzidos segundo a assim chamada tradição chatelperroniana. Na época, os especialistas acreditavam que os artefatos chatelperronianos – ornamentos corporais e ferramentas sofi sticadas de osso, entre outros elementos – teriam sido produzidos por homens modernos. Mas, em vez disso, estabeleceu-se que as descobertas de St. Césaire tinham conexão com o homem de Neandertal.

Você quer saber mais?

http://www2.uol.com.br/sciam/

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

"Canudos"...

Um tema de extremo interesse e que somente tangenciou o Cangaço foi a Rebelião de Canudos.
Este material precioso publicado na net, merece replicação:
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"Expedição de Pedro Wilson Mendes (*) a Canudos"
por Mário Mendes Junior, o "Maninho do Baturité"
Apareceu, originalmente, no site:
http://www.maninhodobaturite.com.br/
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Aos 35 anos de idade, sem embargo da fama de ser um advogado que jamais perdeu uma causa, Pedro Wilson somava ao seu currículo a qualidade de jornalista combativo ininterruptamente disposto a denunciar falcatruas. Em 1949, contudo, o jovem jurista resolve dar um brevíssimo tempo às lides forenses e ao jornalismo para atirar-se na pesquisa histórica.
Longe do o imediatismo das redações, Pedro Wilson se insurge como a primeira voz no deserto a abrir os olhos dos escritores com relação ao verdadeiro caráter de Antonio Vicente Mendes Maciel o Conselheiro.
Sua intenção, verdadeiramente foi dar inicio à reparação da injustiça que tem feito a História do Brasil ao protelar “o empreendimento de um estudo sério e consciencioso da (verdadeira) personalidade misteriosa e complexa” (1) do líder guerrilheiro.
Na verdade ninguém antes do jovem escritor se ocupou, como ele, de tirar das costas do Conselheiro os pejorativos do tipo gnóstico bronco, fanático religioso, taumaturgo, paranóico, santo homem, chefe de jagunços e outros despautérios, não escapados, sequer, da concisão e maestria de Euclides da Cunha no “OS SERTÕES”.

Antes de publicar suas conclusões em seguidas edições do jornal O POVO, no final da década de 1940, Pedro Wilson, em expedição, percorreu de jipe, todos os caminhos trilhados, pelo Conselheiro, tendo como companheiros Osvaldo Vinhas, Sólon Mendes e Zequinha Pinto, todos, amigos leigos na matéria, mas sequiosos de aventuras.

Quixeramobim. Entrevista com Euclides Wicar

Tudo começa no Quixeramobim. Cidade túmulo dos Maciéis, que não se olvidam pelo jeito sangrento de como, muitos, morreram na guerra da família contra os Araújos de Boa Viagem. Nessa cidade Pedro Wilson, encontra o coronel Euclides Wicar de Paula Pessoa, mestre na história do lugar. Durante uma entrevista Wicar, além de oferecê-lo algumas fotografias históricas, ainda, lhe transmite coisas contadas, principalmente, por Belo Flor, um cantador repentista local, falecido há dez anos. Ex-aluno de Antonio Vicente, as histórias de Belo Flor se referiam ao jeito professoral de quando ele deixou o negócio de Quixeramobim, em 1857, e passou a ensinar noções de conhecimento gerais na Escola da Fazenda Tigre, até se mudar para Tamboril.

Cantador Repentista Belarmino Flor, um dos alunos da escola do “Tigre” - Foto de 1939 do arquivo de Euclides Wicar

Fazenda Tigre, um patrimônio histórico

Da sede de Quixeramobim, a expedição se dirige à Fazenda Tigre, então pertencente ao comerciante, industrial e agro-pecuarista Damião Carneiro, que naquela época a modernizava. O dono da fazenda, prazerosamente, usa de toda sua hospitalidade, ao conduzir o visitante aos lugares, freqüentados por Antonio Vicente, enquanto viveu por ali,. A oportunidade propicia ao pesquisador colher fotos da casa grande, da igreja, das ruínas da escola, e demais pontos convenientes ao seu trabalho.

RUÍNA DA ESCOLA DA FAZENDA TIGRE ONDE LECIONOU ANTONIO CONSELHEIRO DEPOIS QUE LIQUIDOU SUA CASA COMERCIAL DE QUIXERAMOBIM -1857 1858.
FOTO DE 1939 DO ARQUIVO DE EUCLIDES WICAR DE PAULA PESSOA


Digno de tombamento as velhas construóes do Tigre, sem embargo dos muitos melhoramentos para torná-la rentável, se deve à determinação de Damião Carneiro de conservá-las como sítio histórico. Esse mesmo cuidado de conservaçao o acompanhou, quando, na década de 1950, ele constrói o enorme açude da fazenda. Naquela ocasião – quem viu não pode esquecer – as muitas centenas de trabalhadores, que em lombos de igual número de burros e jumentos transportavam a terra desmontada dos morros para elevar a outra montanha que serviu de parede para o reservatório. A então, fantástica obra de engenharia campestre, indubitavelmente, ratifica a fé que Damião dedicava a Deus, porque, ali, ele, literalmente, ao seu modo, removeu montanhas.

SOLON MENDES E ZEQUINHA MACIEL PINTO ESCORADOS NAS DUAS DAS TRES FORQUILHAS DE AROEIRA, TUDO QUE RESTOU DO PRÉDIO DA ESCOLA DO TIGRE.

FOTO DO SR DAMIÃO CARNEIRO E DO EXPEDICIONÁRIO SÓLON MENDES EM FRENTE ÀS RUÍNAS DA ANTIGA CAPELINHA ONDE ANTONIO MUITO REZAVA.

Do Tigre a comitiva toma o rumo de Assaré, movida pela informação do coletor Paulo Remígio de Freitas, de que, naquela cidade do Cariri, existia, sobrevivo, um ex-combatente da Guerra de Canudos, que apesar de ter sido membro do estado maior do Conselheiro convivia entre os habitantes no mais completo ostracismo.

Os Irmãos Vila Nova de Assaré à Canudos

Filhos de José Francisco Assunção e de dona Maria da Conceição, Antonio e Honório Vila Nova, nasceram em Assaré, no tempo da guerra do Paraguai. Ainda, eram duas crianças, quando conheceram Antonio Vicente, em 1873, por ocasião de uma passagem do peregrino por aquela cidade.
Reencontraram-se em 1877 quando o pregador resolveu trocar o Ceará pela Bahia, certamente, tangido pela fome da seca que acendeu o êxodo dos cearenses para os cafezais de São Paulo e seringais do Amazonas.
Convidado e ungido pelo Conselheiro como chefe temporal de Belo Monte – nova denominação de Canudos – Antonio Vila Nova, com seu tino administrativo, além de equilibrar as finanças e o abastecimento do lugar, até, fez circular, ali, um tipo de moeda muito bem aceita em toda zona de influência do Arraial, então, o segundo maior pólo produtivo da Bahia.
Ao Antonio Vila Nova competia, também, a guarda do armamento, colhido das forças invasoras vencidas. Isso porque, em Canudos, não se permitia o uso indiscriminado de armas, estas eram distribuídas aos guerrilheiros somente em caso de defesa.
Dono da maior loja do espaço, rico, dentro dos padrões do sertão, alvo preferido das más línguas, Antonio Villa Nova morava no único lugar de Belo Monte literalmente classificável como rua. Ali, as casas eram de tijolo, cobertas de telha, algumas com assoalho de madeira, portanto, bem diferentes, das outras cinco mil taperas de taipa, cobertas de palha, piso de chão batido, erigidas em vielas tortas e becos sem saídas que abrigavam quase 25 mil almas.
Conduzindo sua atribuição sem malquerença a ninguém, os irmãos Vila Nova, apesar de confiarem na obra física do Conselheiro, pouco se importavam com sua fé. Na realidade, ambos, até, nem freqüentavam as devoções, comprometimento optativo em Canudos.
Foi por serem alheios às credulidades dos canudenses, que, nos dias entre a morte do Conselheiro e o cerco definitivo, os Villa Nova saem do Arraial a tempo de escapulir da chacina. Muito embora tivessem brigado até quase o extermínio total, eles regressam definitivamente para seu torrão, onde envelheceram sempre falando bem do pai Conselheiro.
Residentes em Assaré, Antonio e Honório, ajudaram o padre Cícero, em 1913, por ocasião da Sedição de Juazeiro. Foi da cabeça de Antonio Vila Nova, que saiu a idéia da construção do valado em volta da cidade, que, estratégico, serviu de trincheira para os jagunços do Santo Padre rebater as forças do governo de Franco Rabelo aquarteladas no Crato.

Pedro Wilson em Assaré

Pedro Wilson da parte de Honório e de dona Toinha, viúva de Antonio Villa Nova não podia ter melhor acolhida. A família, entusiasmada com o propósito do visitante, cuida logo de proporcionar tudo que podiam em proveito de sua pesquisa. Para começar a boa velhinha se desfaz da única lembrança fotográfica do falecido marido, onde se lia: “Antonio Villa Nova, o herói de duas guerras”.
Deslumbrado, com tanto material para pesquisar, Wilson, atento, inicia a cobertura fotográfica da etapa de Assaré. Além de pessoas, fotografava, ainda, suas armas, verdadeiras relíquias trazidas, por eles, do próprio campo de batalha da Guerra de Canudos – peças do despojo da debandada do exército, material que acumulava uma espada tomada de um oficial, outras carabinas e cunhetes de balas, então, já, resfriadas.

REPRODUÇÃO DA FOTO OFERECIDA POR DONA TOINHA A PEDRO WILSON. TIRADA NO JUAZEIRO DO NORTE NO ANO DE 1916.

Numa das poses, quase em posição de sentido, Honório Vila Nova fez questão, de se munir da mesma “manulincher”, que usou para alvejar Moreira César, o coronel “Corta Cabeças”, comandante da malograda terceira expedição, que vergonhosamente, fugiu do campo da guerra.

O sobrevivente, três vezes, é citado no livro “Os Sertões” de Euclides da Cunha, depois do trabalho de Pedro Wilson, com quase noventa anos de idade, tornou-se o conselheirista mais qualificado para reconstituir a história da Guerra. Altivo, agarrado com a mesma inseparável “manulincher”, há quem diga que foi Honório quem eliminou o “Corta Cabeças”, assim chamavam o coronel Moreira Cesar.
O fato se deu no andamento da terceira expedição do governo contra Canudos, quando, pretensiosamente, o Coronel montou no seu cavalo sob o propósito de dar brio aos soldados. Naquele instante ao avistar o coronel do outro lado, descendo a barranca do rio, Honório, fez posição de tiro, dormiu na pontaria, e disparou, certeiro, o balaço que lhe atingiu a virilha. Se quisesse teria acertado direto no coração e acabar com a vida dele duma vez. Preferiu, entretanto, lhe dá uma morte mais doída fazendo-o sofrer e experimentar, no próprio corpo, a agonia que ele imprimia ao povo agredido, perversamente, em nome da República.
Honório Vila Nova – O velho moço, de quase oitenta e cinco primaveras empunha a “manulincher” com que combateu as tropas do governo, em canudos e uma espada de oficial, a prezada na luta. Foto batida a 22/08/1949
A “manulincher” de Antonio Vila Nova era uma das duas únicas armas automáticas existentes em Canudos ao tempo do ataque de Moreira César. Ambas haviam sido tomadas da Expedição Febrônio de Brito juntamente com 14 cunhetes de balas, e foram as que, produtivamente enfrentaram o exército do Cortador de Cabeças.

Sobre as trilhas de Canudos

A etapa de Assaré se acaba com o “velho moço” Honório Vila Nova se oferecendo para nortear a Expedição de Pedro Wilson até Canudos. A adesão, além de facilitar os objetivos, também, serviu para animar os outros expedicionários que nem sequer sabiam como alcançar Canudos – um trecho longuíssimo de trilhas desabitadas e perigosas.

Enquanto Zequinha conduzia o jipe rompendo os obstáculos do péssimo caminho, o ex-guerrilheiro, pacientemente, ao ser requisitado, rememorava e reconstituía as coisas que sabia, mas sempre, sem esquecer-se de elevar a personalidade marcante do líder Conselheiro sobre os costumes e a vida dos sertanejos.
Quando foi perguntado sobre a significação da profecia de que o SERTÃO VAI VIRAR MAR E O MAR VAI VIRAR SERTÃO, Honório tenta explicar o raciocínio do chefe dizendo:
- Ao pronunciar a célebre profecia, o bom homem, sabia o que o mar representava para os matutos. Eles nunca viram nenhum mar. Mas sabem da sua imensidão e dos seus mistérios.
- Que mistérios? Pergunta Osvaldo. Quem responde a pergunta do cunhado é Pedro Wilson.
- Ora, Osvaldo, esses mistérios, na “parábola” do Conselheiro, faz o sertanejo crer num sertão, hipotético e potencialmente com os mesmos poderes do mar que tudo pode: devora homens, destrói a armada e arrasa cidade.
- Isso mesmo doutor, essa coisa realmente aconteceu, até quando a terceira expedição foi expulsa em debandada – diz Honório encerrado o assunto.

As ruínas de Canudos.

Rompidos vários dias de trilhas, finalmente, deslumbrado, Pedro Wilson pode fotografar Canudos do mesmo ângulo que, de outra vez, o Arraial foi visto pelas forças federais que vinham arrasá-lo: o alto do Mário.

CANUDOS – OUTUBRO DE 1949 – PANORAMA DA CIDADE DE ENTÃO COLALIZADA COMO A OUTRA À MARGEM DO RIO VAZA BARRIS

No mesmo dia, excitados, desceram até as ruínas, momento em que o chefe expedicionário, se dar folga, cai em volta de reconstituições de tudo que se deu por ali no Arraial.
Depois, dia a dia, ajudado pelos companheiros, Pedro cuida de catar subsídios, analisar pedaços de escombros, restos de pedras, banda de tijolos, informações de testemunhas ainda vivas, e, finalmente, tudo, que pudesse ajudar a compreender o porquê de tanta morte, entender tanta reza e compreender tanto ensinamento.
Aquele cenário, para Vila Nova, representava um passado pouco distante – até se lembrava algumas árvores -, mas, para os outros, aquelas ruínas sepultadas no mato, em apenas meio século, pareciam tão antigas como túmulos dos Faraós no Egito.
Quando o jipe se aproxima do centro do ex-arraial, o velho expedicionário vai mostrando os lugares onde um monte de taperas, abrigava às vinte e cinco mil almas, trucidadas pelas forças oficiais. Não contem as lágrimas quando o carro alcança as ruínas da Igreja Velha – ali ele casou-se com a prima Tereza Jardelina de Alencar – foi ela quem o tratou, uma vez, do ferimento à bala, num dos pés. Retirado do entrincheiramento pelo irmão, ela curou a ferida com sumo de pimenta malagueta envolvida em folhas de bananeira.
Benze-se ao passarem diante do cruzeiro. O mesmo cruzeiro de madeira, agora, cheio de furos de balas, mas, ainda, intacto. O rústico monumento resistia ao tempo, do mesmo modo, que, escapou do arraso das tantas dinamites detonadas. Abandonada, mas de pé, aquela cruz continuava ali, orgulhosa da gente que abençoou e não se entregou, até dia em que cinco mil soldados do exercito rugiam sobre os últimos defensores do lugar: um velho, dois homens feitos e uma criança.

A exposição em Fortaleza

Ao regressar a Fortaleza, a Expedição, montou uma Exposição de Fotografias, Armamentos e Outros Materiais colhidos na cidade arrasada. Ali os visitantes curiosos e pesquisadores, enquanto examinavam as fotografias, dirigiam perguntas aos expedicionários, principalmente à Vila Nova, que ali permanecia como testemunha viva da guerra e à disposição de quantos quisessem saber detalhes da sangrenta pagina da História do Brasil.
Paralelamente aos trabalhos da exposição, Pedro Wilson avançava no trabalho jornalístico, histórico-sociológico, “ANTONIO CONSELHEIRO E O DRAMA DE CANUDOS”, publicando-o em capítulos em diferentes edições do jornal O POVO.
O regalo da veia comunista do autor extravasa todo seu talento, quando, em desacordo, com o pensamento de então, pioneiramente, coloca a personalidade do líder canudense entre o pequeno rol de heróis nacionais. No trecho abaixo, extraído da obra histórico-jornalística de Pedro Wilson, se mede o entusiasmo que só brota no coração dos apaixonados por seus ideais:
“(…) Canudos analisado nos seus profundos aspectos sociais, apresenta-nos o fenômeno autêntico de uma guerra de classe. Foi uma revolta de camponeses vergados sob o peso da opressão em seus múltiplos matizes. Aqueles heróis devem figurar na galeria dos filhos do povo, que tombaram em todas as frentes, lutando por uma vida mais digna e mais humana.”

Cobertura Fotográfica da Expedição de Pedro Wilson a Canudos

Prédio onde residiu e negociou Antonio Conselheiro -1856 1857
Quixeramobim 1949. Foto de 1949



O Jipe Land Houver, originário da Inglaterra, lançado em 1948. Um desses primeiros veículos chegados em Fortaleza, importado pelo concessionário Conrado Cabral & CIA., foi adquirido pela Loteria Estadual do Ceará, da qual Pedro Wilson Mendes era sócio-fundador. Na fotografia a seguir é um modelo 1949 que serviu à expedição de Pedro Wilson Mendes tendo como motorista seu primo José Maciel Pinto, o Zequinha. Ao fundo, o canhão que os guerrilheiros tomaram da fracassada Terceira Expedição contra Canudos comandada pelo Cortador de Cabeças Coronel Moreira Cesar. Este militar foi escolhido para comandar a Terceira Expedição Contra Canudos em virtude do seu extraordinário desempenho nas campanhas contra a Revolução Federalista do Rio Grande do Sul.
Durante a permanência da expedição de Pedro Wilson em Canudos, Honório Vila Nova se surpreende ao encontrar pelas redondezas do Arraial arrasado o ex-companheiro Chiquinhão que lhe contou como escapou do cerco em última hora.

CHIQUINHÃO O SOBReVIVENTE AMIGO DE VILA NOVA

Na foto abaixo Pedro Wilson ladeado por Honório Vila Nova e Chiquinhão, os dois matutos de chapéu na mão, talvez em respeito à câmera para eles um objeto muito raro.

PEDRO WILSON LADEADO POR VILA NOVA E CHIQUINHÃO.

Na pagina seguinte, Honório, Chiquinhão e seus netos na Frente do Umbuzeiro do Moreira Cesar. A árvore, assim chamada porque, ali, debaixo dela, foi queimado o cadáver do coronel que mandava degolar dos canudenses aprisionados. Isso mesmo, o exército não fazia prisioneiros. Os defensores de Canudos uma vez capturados pelos soldados, depois de obrigados a dar vivas à República que lhes agredia, eram agarrados pelos cabelos e degolados a golpes de sabres. Cinicamente o degolador afirmava que o “Jagunço” ao ser degolado não “verve” uma xícara de sangue. Na verdade, essa passagem, serve mais, para mostrar a subnutrição imposta ao lugar que chegou a ser o segundo pólo produtor da Bahia, portanto só perdendo para Salvador.

VILA NOVA E CHIQUINHÃO ENTRE SEUS NETOS NO FUNDO O UMBUZEIRO DO MOREIRA CESAR

VILA NOVA E CHIQUINHÃO AO FUNDO O “UMBUZEIRO DO MOREIRA CÉSAR” ASSIM DENOMINADO POR TER SIDO QUEIMADO NO SEU TRONCO O CADÁVER DAQUELE COMANDANTE DA 3ª. EXPEDIÇÃO ABANDONADO QUE FORA PELAS TROPAS NA VERGONHOSA DEBANDADA

OSVALDO VINHAS, CUNHADO DE PEDRO WILSON E HONORIO VILA NOVA EM FRENTE ÀS RUINAS DA IGREJA VELHA, TODA DE PEDRA E CAL. VÊEM-SE CLARAMENTE OS SINAIS DAS BALAS

O CRUZEIRO DA IGREJA VELHA. ESCAPOU “MILAGROSAMENTE” À FÚRIA DOS BOMBARDEIOS, COM MUITO SINAL DE BALAS DE FUZIL NO MADEIRAME.


O Cruzeiro da Igreja Velha juntamente com o canhão tomada da Terceira Expedição, diante da inundação do velho arraial de Canudos pela construção de uma barragem no Vaza Barris, foram transferidos para a cidade de Nova Canudos onde ainda hoje se encontra.
Nas fotografias seguintes os habitantes da nova aldeia e a pobreza daquilo que sob a liderança do Conselheiro foi o segundo pólo produtor da Bahia.


Na Canudos que ficou o povo para escapar da sede se abastece de água nas cacimbas furadas nas vazantes do rio. Observe-se no meio das mulheres Antonio Villa Nova e por traz o jipe da expedição.
Na próxima foto, Honório Vila Nova e Chiquinhão na cruz gravada no tumulo de António Conselheiro de onde, depois, seu corpo foi desenterrado e degolado. Seu crânio foi enviado a Salvador para estudos “científicos”.

Vila Nova e Chiquinhão de chapéu na mão em respeito do seu guia ali enterrado e depois exumado.

VILA NOVA COM HABITANTES DA NOVA CANUDOS

HABITANTES DA NOVA CANUDOS EM 1949

SENHORA HABITANTE DA NOVA CANUDOS EM 1949
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Uauá, 1949, Zequinha Maciel Pinto, o guiador do Jipe e Honório Vila Nova em frente ao prédio onde a 1ª. Expedição Comandada Pelo Tenente Pires Ferreira foi surpreendia pelos conselheiristas. Fotografias tomadas da frente e do oitão da casa.

Monte Santo – A primeira etapa da ascensão.

CRUCIS MANUSCRITO COM A LETRA DE PEDRO WILSON

Colaboradores locais do Dr. Pedro Wilson Mendes

HONÓRIO VILA NOVA - O BOM EX-COMBATENTE QUE MORREU QUASE AOS 105 ANOS DE IDADE, PASSOU A SER A PEÇA MAIS IMPORTANTE PARA QUEM QUISESSE ESTUDAR O ASSUNTO. - A pose dos fotografados induz a sensação de dever cumprido.

A Exposição de Fortaleza tendo o próprio Vila Nova à disposição dos interessados impõe, a escritores de porte como Abelardo Montenegro e Nertan Macedo, se entregarem ao dever de reparar a injustiça que, até então, só se preocupava nas fraquezas do Santo Homem, inclusive de outros sempre “protelando o empreendimento de estudo sério e consciencioso da personalidade misteriosa e complexa”, (2), mas, capaz de se elevar no rol dos pouquíssimos heróis, de fato, da História do Brasil.

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(1) Trecho de Pedro Alan Mendes Maciel em memória ao tio Pedro Wilson..

(1) Maciel, José. Minhas Idéias Crônicas. Editora Aula. Rio. 1986.

(*) Pedro Wilson Maciel Mendes, intrépido advogado baturiteense, covardemente assassinado, em Fortaleza, a 22 de janeiro de 1952, pelo simples fato de ter colocado, sempre, a força do Direito e suas convicções em prol dos oprimidos e contra as misérias oriundas das desigualdades sociais. Trecho de Pedro Alan Mendes Maciel em memória ao tio Pedro Wilson.

Esse post foi publicado de segunda-feira, 27 de julho de 2009 às 5:09 pm, e arquivado em HISTÓRIA DA CIDADE. Você pode acompanhar os comentários desse post através do feed RSS 2.0. Você pode comentar ou mandar um trackback do seu site pra cá.
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Complô de Mossoró: Por Marcos Pinto a Honório de Medeiros

Defesa de Mossoró a partir da casa de Rodolfo Fernandes

Reproduzimos a espetacular entrevista do historiador potiguar Marcos Pinto, prestada ao blog honoriodemedeiros; vale ressaltar a luz que ainda precisa ser fortalecida a cerca do ataque de Virgulino a Mossoró. Parabens ao amigo Honório e a Marcos Pinto pela oportuna entrevista.

Honório: vc é defensor da teoria da participação direta, embora oculta, de Jerônimo Rosado nas articulações para o ataque de Lampião à Mossoró. Como isso aconteceu?

Marcos: Cresci ouvindo meu avô paterno ARISTIDES FERREIRA PINTO (18.04.1907 / 19.09.1975) narrar, de forma minuciosa, no alpendre de sua fazenda, a saga do seu irmão Cel. FRANCISCO FERREIRA PINTO (17.04.1895 / 02.05.1934), sempre relatando trechos da carta escrita pelo mesmo, e enviada para o seu parente RODOLFO FERNANDES, por emissário especial, após o célebre ataque à Apodi por uma parte do bando do famigerado Lampião, comandados pelo célebre cangaceiro Massilon Benevides, fato ocorrido à 10 de Maio de 1927.

Honório: em que vc se fundamenta para defender essa teoria?

Marcos: Lembro-me que o meu avô fez o relato sempre observando ter ouvido inúmeras vezes do seu perseguido irmão, que dentre o intrincado de particularidades da missiva informando o Rodolfo, destacava:

- Que fora informado por pessoa de acentuada estima e confiança, de que fora armado um complô com fito único de exterminá-los fisicamente, engendrado pelo quarteto sinistro composta por Jerônimo Rosado, Felipe Guerra, seu cunhado Tilon Gurgel, que por sua vez arregimentou a participação do seu genro Décio Holanda;

RODOLFO FERNANDES

- O alerta a Rodolfo para a necessidade e cuidados de chefe de estado em só arregimentar pessoas de sua mais íntima amizade e confiança, de preferência parentes;
- Que o complô tinha como objetivo abrir lacunas nos executivos de Apodi e Mossoró, proporcionando a assunção de Tilon Gurgel em Apodi, e o retorno de Jerônimo Rosado ao comando do executivo mossoroense, na Presidência da Intendência municipal (Equivalente ao de Prefeito) que já ocupara no período 1917-1919, tendo como Vice-Presidente da Intendência (equivalente ao cargo de Vice-Prefeito) o Dr. Antonio Soares Júnior, genro de Felipe Guerra;

Honório: é sabido de sua anterior e forte ligação com Vingt-Un Rosado. Seu afastamento dele se deveu à sua teoria acerca da participação de Jerônimo Rosado no ataque de Lampião a Mossoró?

Marcos: Antes de adentrar na resposta, faço a observação de que o grande e profícuo historiador VINGT-UN ROSADO enfatizou, em um dos seus livros em que aborda a atuação de seu irmão Dix-Sept como governador do RN, a importância do mesmo ter ratificado o intrínseco vínculo de amizade existente entre seu pai (Jerônimo Rosado) e o Dr. Felipe Guerra,com a nomeação do Dr. OTO GUERRA para o pomposo cargo de Procurador Geral do Estado.

Acredito que o sutil afastamento do VINGT-UN em relação a minha pessoa dera-se em decorrência de um artigo que escrevi em um jornal de Mossoró, com o sugestivo título "FORJARAM FATOS NA HISTÓRIA DE MOSSORÓ" em que desmitifiquei fatos supostamente históricos elencados por VINGT-UN sobre o "MOTIM DAS MULHERES" e sob o verdadeiro motivo que fez com que o então governador DIX-SEPT ROSADO encetasse a viagem ao Rio de Janeiro, então Capital da República, ou seja, que a viagem dera-se em atendimento a um telegrama enviado pelo Presidente Getúlio Vargas, que pretendia aparar arestas existentes entre DIX-SEPT e o CAFÉ FILHO, então Vice-Presidente da república. Ressalte-se que o Dr. VINGT-UN nunca deixou de saudar-me quando nos encontrávamos. Em que cofre estará escondida a carta do Cel. Francisco Pinto? Terá sido incinerada pelo Dr. Aldo Fernandes, genro de Jerônimo Rosado ? Por que deram sumiço a essa prova, que paira apenas como uma referência metafórica a um segredo ?

Honório: há, em sua opinião, alguma relação entre o ataque a Apodi, feito por Massilon, e o ataque a Mossoró, no qual esse cangaceiro chefiava um dos subgrupos de Lampião?

Marcos: Os interesses políticos e pessoais que uniam JERÔNIMO ROSADO, FELIPE GUERRA e seu cunhado TILON GURGEL, somado à intrínseca participação do seu genro Décio Holanda, conduz à certeza de que havia um consórcio em confidências íntimas e profundas. Delas se poderá até deduzir que, nos episódios do 10 de Maio de 1927 e de 13 de Junho do mesmo ano, Jerônimo e Felipe Guerra atuaram como espécies de mentores com acentuadas ascendências. As perspectivas de sucesso das nefastas empreitadas alegravam perversamente os seus espíritos. Em sentido adverso a eles, os desígnios divinos anularam tamanha virulência em matéria de inveja e cobiça. Nuances que anularam seus princípios de homens públicos e anulam suas individualidades. Foram pródigos em protagonizarem distorções de caráter. A ânsia pelo poder fez com que perdessem inteiramente o contato com a realidade.

Honório: vc está escrevendo algum livro, atualmente?

Marcos: Sim, estou em fase de conclusão trabalho de cunho histórico/genealógico com o título "SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA FAMÍLIAS APODIENSES".

Honório de Medeiros

EXTRAÍDO DO BLOG: CARIRICANGAÇO.COM

Limões X Jesuino

Achados do Cangaço da Família Limão

Por Epitácio de Andrade

“José Rodrigues de Barros ficou considerado como o patriarca dos Limões, porque se casou com Maria Rosalina da Conceição, irmã de Preto Limão”, assim afirmou José Alves Rodrigues, conhecido como “Zé Limão”, neto do “patriarca”, em entrevista a Epitácio de Andrade Filho, autor de “A Saga dos Limões – Negritude no Enfrentamento ao Cangaço de Jesuíno Brilhante”, no último dia 15 de dezembro, em sua residência no Bairro Paulo VI, na cidade de Caicó, na região do Seridó do Rio Grande do Norte.
  
No final do Século XIX, o Cearense José Rodrigues de Barros assumiu a liderança do Grupo étnico representado pela família Limão, principal algoz dos “Brilhantes”, ao se casar com uma irmã de Preto Limão, único sobrevivente masculino da família remanescente do conflito cangaceiro e comandante da emboscada fatal contra Jesuíno Brilhante, na Comunidade Santo Antônio, na zona rural de São José de Brejo do Cruz, na fronteira paraibana, em dezembro de 1879.


O Patriarca aos 100 anos 
Reprodução: Epitácio Andrade
 
A primeira imagem do “Patriarca dos Limões” foi resgatada pelos pesquisadores Emanoel Amaral e Alcides Bezerra de Sales, em 1981, quando levantavam dados para a elaboração da Revista “Jesuíno Brilhante em História de Quadrinhos”, na Comunidade Saco dos Limões, na zona rural do município de Patu/RN, terra natal do Cangaceiro Jesuíno Brilhante (1844). A fotografia é datada do início do século passado e foi apresentada pelo neto José Alves Rodrigues, 60 anos, o mesmo membro da família Limão, que trinta anos depois, apresentou a fotografia do avô aos 100 anos (1963), para ser reproduzida pelo Escritor Epitácio de Andrade Filho.


Festa dos 100 anos do “Patriarca dos Limões” 
Reprodução: Epitácio de Andrade
 
No ano de 1963, a família Limão comemorou festivamente o centenário do Patriarca José Rodrigues de Barros, que nunca participou de atividades cangaceiras, mas teve a tarefa de proteger a família das possíveis recidivas do conflito, depois da morte de Jesuíno Brilhante, organizando inclusive, um esconderijo inexpugnável e recôndito, o “Saco dos Limões”. Na festa do centenário, o grande líder já não contava com sua companheira Maria Rosalina da Conceição, a Limão genuína, que faleceu com cerca de 50 anos, provavelmente no final da década de 20 para início dos anos 30 do século passado, e se encontra sepultada no cemitério de Catolé do Rocha, no vizinho estado da Paraíba.




Do casamento de Seu José Rodrigues Barros com Rosalina Limão, que moravam no Sítio Coroatá, na zona rural entre Patu e Almino Afonso, saíram vários filhos, entre homens e mulheres. O mais velho Antônio Limão migrou para o norte do país e lá permaneceu até a morte. Em 1888, nasceu Zé Limão, que foi fotografado por Emanoel Amaral aos 93 anos, no ano de 1981.

 
Zé Limão aos 93 anos 
Foto: Emanoel Amaral - 1981
 
Em 1898, nasceu Luiz Limão ou Luiz Catonho que se casou com Anelita Alves Rodrigues, afilhada de Valdivino Lobo, o mais abastado dos fazendeiros inimigos de Jesuíno Brilhante e coiteiro dos Limões na região do Catolé do Rocha e Brejo do Cruz, na fronteira paraibana. Em 1981, o pesquisador Emanoel Cândido do Amaral também fotografou Luiz Limão.

 
Luiz Limão aos 83 anos 
Foto: Amanoel Amaral - 1981
 
José Alves Rodrigues, Zé Limão, é filho de Luiz Catonho com Anelita Alves Rodrigues, e em 1981, acolheu Emanoel Amaral e Alcides Sales para prestar informações sobre a família Limão e posar para uma fotografia nas adjacências do “Saco dos Limões”, com seus filhos Ângelo Márcio e Marcélio Alves, que na época tinham sete e três anos, respectivamente.


Zé Limão com filhos Marcélio e Ângelo 
Foto: Emanoel Amaral - 1981

 
Coincidentemente, no dia 15 de dezembro de 2011, data da visita a residência de José Alves Rodrigues, em Caicó, estava completando 28 anos da morte de Seu Luiz Limão, que faleceu em 1983, e se encontra sepultado, juntamente com seu pai, o “Patriarca dos Limões”, no cemitério velho do antigo povoado da Caiera, hoje Almino Afonso, no Rio Grande do Norte.
 

Luiz Limão aos 75 anos 
Reprodução: Epitácio de Andrade

 
Seu Zé Limão, aos 60 anos, está na terceira geração posterior ao cangaço da segunda metade do século XIX. O seu pai, Luiz Limão com os irmãos, compõem a segunda geração pós-cangaço jesuínico, e o casamento do “Patriarca” com Rosalina Limão é o representante da primeira geração, imediatamente posterior ao cangaço dos Brilhantes com os Limões. Esta seqüência geracional pode ser observada no álbum familiar, exposto na sala principal da casa de Seu José Limão, em Caicó/RN.

A família Limão tem uma consciência pela preservação da memória muito acurada. Mantem sob sua guarda um acervo de fotografias, apetrechos, moedas, cédulas e armas, que segundo José Limão “pertencia aos antigos”. Em 1981, quando foi fotografado por Emanoel Amaral mostrava uma espingarda de caça, que preserva até hoje. Mesmo informando que é um objeto de 40 a 50 anos, a preservação é, por ele, justificada como lembrança do momento da pesquisa e como símbolo de que “os Limões faziam suas próprias armas”.


Espingarda fotografada em 1981 no Saco dos Limões – Patu/RN 
Foto: Epitácio Andrade
 
Contemporânea do período do Cangaço dos Brilhantes com os Limões (1870-1880), Seu Zé Limão apresentou uma faca, cujo cabo de madeira se desgastou ao longo de mais de uma centena de anos, sendo substituído por uma haste de aço, porém a grande lâmina de ferro fundido foi preservada.


Lâmina de uma faca do cangaço dos Limões 
Foto: Epitácio Andrade
 
Seu Zé Limão preserva uma cédula antiga, “do tempo do cruzeiro”, com a imagem de Duque de Caxias, para preservar a memória de que “os Limões resistiram ao recrutamento forçado para a Guerra do Paraguai”.



 Cédula de Cruzeiro com imagem de Duque de Caxias 
Foto: Epitácio Andrade
 
O acervo de moedas cunhadas em 1870 preserva a memória da proteção dos comboios do comércio primitivo do sertão, que era promovida pelos membros da família Limão, depois da aliança com os Lobos e os Lobatos, controladores da economia loco - regional. Não seria desnecessário afirmar que os Limões foram agentes pró-ativos de importantes lutas sociais, e como afirma Alicio Barreto em “Solos de Avena”, “é possível que voltaram ricos do quebra-quilos”.


Moedas do período do Cangaço jesuínico 
Foto: Epitácio Andrade
 
Com muita cordialidade e presteza o Aposentado José Alves Rodrigues (Zé Limão) e sua esposa Maria Emília Cordeiro Alves, que é da descendência de Jesuíno Brilhante, prestaram as informações solicitadas pelo pesquisador Epitácio Andrade e serviram café num bule datado do início do século passado.


Bule do início do séc. XX 
Foto: Epitácio Andrade
 
Igualmente gentil foi o filho de Seu Zé Limão, Ângelo Márcio, que tem total lembrança da visita feita por Emanoel Amaral e Alcides Sales no início dos anos 80 do século passado, ao “Saco dos Limões”.


Ângelo Márcio, Zé Limão e o Autor de “A Saga dos Limões” 
Foto: Josivaldo Araújo
 
Os próximos passos serão uma visita ao “Saco dos Limões”, na zona rural do Patu, ao Sítio São Francisco, no Catolé do Rocha, e uma entrevista com Manoel Catonho, para consolidar informações para a segunda edição ampliada de “A Saga dos Limões”.


*Epitácio de Andrade Filho é autor do livro "A Saga dos Limões – Negritude no Enfrentamento ao Cangaço de Jesuíno Brilhante”, Médico Psiquiatra e Pesquisador Social.
 
FONTE: www.lampiaoacesso.blogspot.com  extraído em quinta-feira, 22 de dezembro de 2011.